São Paulo, quarta-feira, 27 de junho de 2007

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Correr por agasalho leva ao Pan

Rosângela Oliveira será a única atleta de um programa de inclusão do Rio a competir nos Jogos

Nascida nos EUA, velocista, que foi ao Troféu Brasil de olho em vaga de reserva no time, o que lhe daria a roupa oficial, leva vaga no 4 x 100 m


SÉRGIO RANGEL
DA SUCURSAL DO RIO

Ela nasceu nos EUA e será a única atleta de um projeto de inclusão social da Prefeitura do Rio a disputar o Pan do Rio.
Com 16 anos, a velocista Rosângela Oliveira garantiu na semana passada a classificação para a equipe brasileira que vai disputar o revezamento 4 x 100 m nos Jogos de julho. Desde 2002, ela treina na Vila Olímpica Mestre André, em Padre Miguel (zona oeste do Rio).
""Espero servir de estímulo para todas as comunidades. Quero ser um exemplo positivo aqui e mostrar que todos também podem ter sucesso", declarou Rosângela, que ainda se exercita duas vezes por semana na pista de 180 metros de Padre Miguel. O centro esportivo fica localizado ao lado da Vila Vintém, uma das mais violentas favelas da região.
Filha de brasileiros, Rosângela nasceu em Washington, mas deixou os EUA antes de completar dois anos de idade.
Com problemas de saúde por causa do frio rigoroso norte-americano, voltou ao país para morar com uma tia em Padre Miguel. ""Tenho ainda os dois passaportes, mas nunca pensei em competir por lá. Apesar de todas as dificuldades, gosto daqui demais", afirma Rosângela, que assegurou a classificação para o Pan-Americano com o terceiro melhor tempo do país nesta temporada. Ela percorreu os 100 m em 11s50.
Neta de um dos fundadores da Mocidade Independente, a atleta mora num conjunto habitacional no bairro com a tia e tem apenas uma fonte de renda: a ajuda financeira que a mãe envia mensalmente dos EUA.
""As coisas são sempre muito apertadas. Muita gente ajuda. O táxi faz as corridas fiado. Deixo de pagar alguma conta para ajudar em uma viagem. O importante é ela fazer o que gosta. Acho que todos nós estamos dando uma outra oportunidade para a Rosângela", argumentou Maria das Graças de Oliveira, 57, que não esconde a surpresa com os excelentes resultados obtidos pela sobrinha.
Antes do Pan, a atleta vai disputar o Sul-Americano juvenil e o Mundial da categoria, na República Tcheca.
""Na véspera do Troféu Brasil [prova em que conseguiu o índice], ela disse que iria para São Paulo tentar ficar na reserva da seleção. Até brincou e disse que queria mesmo era o casaco da seleção, que ela acha lindo. Por isso, não levei muita fé. Acho que a ficha ainda não caiu para nós duas", acrescentou a tia.
Apesar de fazer questão de se preparar em Padre Miguel, a velocista já teve a rotina de treinos várias vezes interrompida por causa da violência no bairro e perdeu alguns companheiros do centro esportivo para o tráfico. Os tiroteios são constantes nas proximidades da vila.
Várias casas vizinhas do centro esportivo têm marcas de balas em suas paredes.
""Um dos meninos já competiu até no Brasileiro juvenil, tinha excelentes marcas, mas teve que parar com o esporte depois de ter sido preso por roubo de carro. É uma situação triste, que todos nós temos que reverter", disse Rosângela, que tem proposta de clubes de São Paulo e do Rio Grande do Sul para deixar o Rio de Janeiro.
As vilas olímpicas municipais oferecem atividades de esportes e lazer para cerca de 75 mil pessoas, em nove comunidades com alguns dos índices de IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) mais baixos da cidade. A prefeitura gasta R$ 40 milhões com o projeto. Além de atletismo, as vilas dão aulas de natação, basquete, vôlei, futebol, lutas, balé e dança.
""A Rosângela é apenas o primeiro fruto. Tenho certeza de que vários outros atletas vão aparecer, de todas as vilas. Quero tirar mais crianças dali de dentro", disse a técnica Edileuza Medeiros, apontando para uma entrada da Vila Vintém.


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