São Paulo, sexta-feira, 27 de agosto de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

POLÍTICA

Eleição de esportistas para comissão do COI tem 32 candidatos, muitos desconhecidos, e pouca empolgação dos interessados

Voto de atleta

DO ENVIADO A ATENAS

Era mais um escaldante início de tarde na Vila Olímpica, e "Zorba, o Grego" começou a tocar nos alto-falantes. Na Atenas dos Jogos, é a senha para avisar que algo importante está para acontecer.
Um grupo de atletas, não mais do que 50, segue para uma tenda. Presidente do grupo de trabalho de mulheres no esporte do COI, a ex-remadora Anita Defrantz anuncia empolgada no microfone que serão revelados os eleitos para a Comissão de Atletas do Comitê Olímpico Internacional.
Aqueles 50 da tenda aplaudem com o mesmo entusiasmo. Ali ao lado, porém, outros atletas, milhares deles, passeiam na Vila, vão ao cibercafé, concedem entrevistas, trocam pins, compram lembrancinhas. "Nem sabia que estava rolando essa eleição", diz Bruno Bomfim, brasileiro, nadador.
Criada em 81 para ser o "elo de ligação entre os atletas e o COI", como diz a entidade, a Comissão de Atletas nunca chegou a empolgar. Reúne-se apenas uma vez por ano e a sua principal aplicação prática é dar consultoria para organizadores de futuros Jogos.
É formada por 19 atletas. Desses, oito são eleitos, quatro por Olimpíada, para mandatos de oito anos. Outros quatro são representantes dos Jogos de Inverno. E sete são indicados pelo COI, para "garantir o equilíbrio entre as regiões, os sexos e os esportes".
O serviço não é remunerado nem rende publicidade. Enfim, não é nada muito glamouroso. Mas, como em eleição para síndico de prédio, sempre surgem os candidatos. Em Atenas, foram 32.
Entre eles, Konstantinos Kenteris, o velocista grego que foi notícia antes da cerimônia de abertura por supostamente ter fugido do exame antidoping. E alguns quase anônimos para a massa dos votantes, como o atirador peruano Francisco Boza e o remador dinamarquês Victor Feddersen.
Por razões óbvias, suas candidaturas naufragaram. Os eleitos para um mandato até 2012 são, por ordem de votos, o velocista namíbio Frank Fredericks (1.849), o tcheco do lançamento de dardo Jan Zelezny (1.411), o meio-fundista marroquino Hicham El Guerrouj (1.260) e a ex-nadadora egípcia Rania Elwani (1.186).
Segundo o COI, 5.787 atletas, ou 54,5% dos inscritos para os Jogos, votaram em postos no refeitório, em blocos de apartamentos da Vila e nos estádios de futebol em outras cidades-sede. Em Sydney, o comparecimento foi de 47,2%.
"A eleição foi muito difícil, e estou muito feliz. O maior problema é que as pessoas ainda não sabem da votação, e a gente tem que ficar explicando como funciona, o que a gente faz, quais são nossas idéias", declarou Rania à Folha.
Ela já atuava na comissão como uma das indicadas pelo COI. Agora, ganha mais oito anos. "Vou me concentrar no trabalho contra o doping e contra o preconceito às mulheres que praticam esportes em países árabes", completa a egípcia, personagem das últimas três Olimpíadas por tirar o véu e, de maiô, ter obtido bons resultados nas piscinas no nado livre.
Membro do COI e presidente da comissão, o ucraniano Sergey Bubka, ouro em Seul-88 e hexacampeão mundial do salto com vara, dizia-se "orgulhoso e feliz" com o processo de votação.
Mas, questionado por um repórter dinamarquês sobre a pouca divulgação da eleição, irritou-se. "Fico surpreso com as críticas. O processo foi justo, e a organização, excelente. Não espalhamos cartazes e urnas pelos ginásios porque são lugares para competir, não para votar. Não queríamos perturbar ninguém."
Bubka então pede licença e sai pisando duro. Deixa a tenda e passa despercebido por uma turba de atletas que, já no fim das competições, se ocupa em paquerar, passear por Atenas, esperar a cerimônia de encerramento. É um cartola. Uma espécie de rei sem reino. Ou de síndico de um prédio vazio. (FÁBIO SEIXAS)


Texto Anterior: Doping: Casos beiram recorde, mas comitê enxuga a conta dos flagrados
Próximo Texto: Notas
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.