São Paulo, quarta-feira, 27 de dezembro de 2000

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FUTEBOL

Beleza é fundamental

TOSTÃO
COLUNISTA DA FOLHA

Neste ano, Cruzeiro e Palmeiras foram muito bem treinados, montaram times eficientes e disciplinados, reunindo bons jogadores e esquemas táticos. Contudo faltou o principal: talento individual. A equipe do Cruzeiro é um pouco superior.
O Vasco de Oswaldo Oliveira e Joel Santana não obteve destaque pelas mesmas qualidades. Tem o que falta aos outros dois: jogadores excepcionais.
Quando os craques se unem e vibram, eles fazem a diferença.
Coloque os dois Juninhos, Romário e Euller nas organizadas equipes do Cruzeiro e do Palmeiras. Serão dois timaços. Muito melhores que o Vasco.
No início de suas carreiras, alguns jogadores são rotulados de esforçados e cumpridores de esquemas táticos. Depois, por melhor que joguem, nunca são valorizados. Quando brilham, dizem, no máximo, que foram eficientes. Se eles jogam mal, são ridicularizados.
Euller é um exemplo. Com o tempo, além de velocidade, adquiriu habilidade e técnica. Não é um craque, mas é um excelente jogador e um dos principais atacantes do Brasil. É preciso melhorar tanto conceito como status do jogador brasileiro.
O gol do Euller, contra o Cruzeiro, foi primoroso. Num instante, dominou a bola com perfeição, tocou-a com um pé e, com o outro, finalizou no canto. Se fosse do Romário, diriam que foi um gol de gênio.
Ao contrário de Euller, há jogadores rotulados de craques e que "deitam na cama". Ou nunca foram craques. Mesmo assim, continuam supervalorizados.
Enquanto o Vasco tem alguns jogadores excepcionais, a diretoria do Cruzeiro preocupou-se com a contratação de um excelente técnico. Pensou que, com o Felipão, o time ganharia tudo.
Seria a união perfeita de um clube com tradição em disputar e ganhar títulos com a tão falada competência do treinador. O Cruzeiro perdeu a Mercosul e a João Havelange. Com Marco Aurélio, venceu a Copa do Brasil.
Para ter mais chances de ganhar a Taça Libertadores, com ou sem o bom técnico Felipão, a equipe do Cruzeiro precisa contratar, no mínimo, dois excepcionais jogadores. São mais importantes que o treinador.
Hoje, na final da Copa João Havelange, o Vasco enfrenta o ótimo São Caetano. Por mais respeito que os jogadores tenham pelo Azulão, no íntimo pensam que será muito mais fácil do que ganhar do Cruzeiro e do Palmeiras. Aí é que mora o perigo!
Serão, provavelmente, duas partidas de muitos gols. Os dois ataques são velozes, habilidosos, criativos e competentes. As defesas são bastante vulneráveis. A do São Caetano atua desprotegida. Já a do Vasco é mal posicionada e falha individualmente.
A escalação do Nasa não alterou nada. O time levou três gols do Palmeiras no primeiro tempo. O Cruzeiro não soube aproveitar essa deficiência.
Espero que esses dois jogos sejam uma amostra dos times e da seleção brasileira do próximo ano: ousados, bonitos e eficientes.
Que me perdoem os técnicos modernos e prepotentes, mas, no futebol, beleza é fundamental.
Reclamo muito da mesmice dos técnicos, da falta de variação na maneira de jogar dos times brasileiros, mas reconheço e compreendo o quanto é difícil inovar.
Nós, comentaristas, na maioria das vezes também falamos e escrevemos sobre os mesmos temas do futebol. Difícil não repetir. O leitor deve ficar cansado de nossos conceitos e opiniões.
Frequentemente leio uma coluna de um colega, parecida com a minha. Certamente tem a mesma impressão quando lê as minhas. Cada um com seu estilo. As idéias e temas se repetem. Quando não repetimos os outros, copiamos nós mesmos. Vivemos repetindo.
É difícil mudar a maneira tradicional de jogar. A maioria das transformações, no futebol e na vida, é lenta. Pouco disso se percebe.
Talvez a única mudança brusca, surpreendente e revolucionária tenha sido a seleção holandesa de 74. Durou pouco tempo. Ninguém conseguiu imitá-la.
Os jogadores de defesa, meio-campo e ataque se misturavam em campo. Confundiam o outro time. Onde estava a bola, havia mais jogadores holandeses. Na verdade, essa postura não foi tão original. Copiaram essa tática da pelada. Era pelada organizada, profissional.
A maior dificuldade na vida é ser original. Só os gênios conseguem. São raros. Por isso são gênios.
Como não tenho nenhuma idéia original para terminar essa coluna, repito que a vida, a literatura e o futebol são discursos e variações sobre os mesmos temas: nascimento, morte, amor, paixão, razão, futebol arte, futebol de resultados e poucos outros.
O restante é o resto.

E-mail: tostao.folha@uol.com.br

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