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Depois de Sydney, Atenas e Pequim, astro da seleção sobrevive de bicos
DO ENVIADO A CAMPO GRANDE
Luciano Gonçalves Rocha
nasceu num Fusca, há 30 anos,
quando o pai e a mãe tentavam
vencer a tempo os cem quilômetros que separam Ribas do
Rio Pardo de Campo Grande.
O parto complicado resultou
em paralisia parcial do lado direito de seu organismo. Desde
então, ele tenta se superar.
Aos dois anos, foi abandonado pelo pai, mas mantém bom
relacionamento com ele até hoje. Cresceu vendo a mãe brigar
para receber pensão alimentícia. "Até ameaçada de morte
pelo meu pai ela foi."
A deficiência, que foi uma
grande dificuldade durante a
infância, Luciano tratou de
transformar em vantagem.
Aos 30 anos, ele acumula um
currículo raro entre atletas brasileiros. Disputou três Paraolimpíadas, ganhou medalha em
duas, foi figura certa na seleção
brasileira da modalidade nos
últimos 12 anos. Só ficou fora
de convocações duas vezes.
Tanto sucesso, porém, não
resistiu a uma série de reveses e
decisões equivocadas. Luciano
hoje vive de favores. Depende
basicamente dos bicos de motorista que a irmã consegue para ele na agência de viagens em
que trabalha.
Não recebe os R$ 2,5 mil
mensais a que teria direito do
bolsa-atleta porque ele não enviou a documentação a tempo.
Espera voltar a ganhar o benefício no ano que vem.
A casa que havia construído
deixou para a ex-mulher no divórcio, há dois anos. Sobrou
uma moto modelo CG125, que
ele usa para ir treinar.
Hoje, mora num puxadinho
de três cômodos com telhado
de zinco, nos fundos de uma casa no bairro Jardim Tiradentes,
periferia de Campo Grande.
Lá estão guardadas a medalha de bronze conquistada em
Sidney-2000, a prata de Atenas-2004 (que ele pensou em
derreter e vender, mas desistiu) e dezenas de outros prêmios e recortes de jornal.
No chão da sala, uma foto
emoldurada de Luciano abraçado ao presidente Lula aguarda para ser pendurada.
"São meus dois grandes orgulhos", diz, sobre a foto com
Lula e a bola vermelha que
trouxe de Pequim, onde terminou em quarto lugar com a seleção brasileira paraolímpica.
Em 2002, "quando estava no
auge", Luciano aceitou um convite para trocar Campo Grande
pelo Rio de Janeiro. Jogou dois
anos no time da Andef, que lhe
pagava R$ 1.000 por mês. "Foi a
melhor época da minha vida."
Recebeu uma proposta "para
ganhar mais" e voltou a morar
em Campo Grande. A proposta,
feita pelo técnico Dolvair Castelli, nunca se concretizou.
"Mas não ponho culpa nele",
resigna-se. "Ele não conseguiu
o patrocínio que esperava."
O fato de jogar sem receber
virou um problema ainda
maior a partir de 2005, quando
nasceu Kauã, com o mesmo
problema do pai: paralisia cerebral. O menino passou por duas
cirurgias no tornozelo esquerdo e já recuperou a maior parte
dos movimentos.
Foi por causa dele que Luciano não vendeu as medalhas
olímpicas e guarda os recortes
de jornal. "Quero que ele saiba
quem foi o pai dele."
(MF)
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