São Paulo, sábado, 28 de fevereiro de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

FUTEBOL

Meu dia de Ronaldo

JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA

O título acima me foi sugerido pelo colega e amigo Fábio Victor, quando eu disse a ele que sofreria uma cirurgia no joelho. Minha contusão, numa partida de futebol soçaite, soava como a de um boleiro profissional: lesão no menisco medial e ruptura do ligamento cruzado anterior.
Pois bem: quando você estiver lendo esta coluna, já deverei ter saído da sala de cirurgia. Se tudo correr bem, poderei voltar a jogar bola em oito meses, depois de um longo e paciente trabalho de fisioterapia. Valerá a pena?
Sem resposta para essa pergunta, ponho-me a especular sobre a importância capital do joelho para o jogador de futebol. Esta coluna, aliás, poderia se chamar "Ode ao joelho". Basta pensar na longa lista de futebolistas que tiveram suas carreiras truncadas por lesões no dito cujo. A começar por Garrincha, cuja má formação congênita provocou um desgaste precoce da articulação do joelho, o que o levou a jogar com dores ou sob o efeito de injeções durante boa parte de sua carreira.
Alguns casos foram particularmente dramáticos, como o de Reinaldo, do Atlético-MG e da seleção. Caçado impiedosamente em campo, com pouco mais de 20 anos ele já havia extraído os quatro meniscos, o que não o impediu de ser um dos artilheiros mais fabulosos que já existiram. Imagine o que não teria feito se tivesse os joelhos inteiros.
Outros craques foram traídos pelos joelhos em momentos cruciais de sua vida profissional. Um exemplo é o volante Clodoaldo, cortado da seleção brasileira às vésperas da Copa de 74. Zico, por sua vez, jogou no sacrifício a Copa de 86, entrando apenas no segundo tempo das partidas.
Ainda no que se refere às Copas do Mundo, o caso mais espetacular certamente é o do líbero italiano Franco Baresi, que lesionou o menisco no início do Mundial de 94, foi operado durante o torneio e se recuperou a tempo de disputar a final contra o Brasil -e perder um pênalti decisivo, a exemplo do que havia ocorrido com Zico oito anos antes. É isso que eu chamo de morrer na praia.
Um capítulo à parte poderia ser reservado aos joelhos de Ronaldo, em particular ao direito, cuja evolução clínica foi acompanhada praticamente dia a dia por bilhões de pessoas em todo o mundo. Outros craques sabotados pelos joelhos em circunstâncias variadas de suas carreiras: Falcão, Amoroso, Baggio, Gullit, Denílson, Luizão, Careca... A lista não tem fim.
O caso de Careca, aliás, é singular. O atacante teve uma ruptura de cruzado anterior (igual à minha, se me permitem a presunção) quando ainda jogava no Guarani e nunca fez sua reconstituição (só operou o menisco). Ou seja: brilhou no São Paulo, no Napoli e na seleção brasileira com o ligamento rompido, algo que só foi possível graças a suas condições físicas excepcionais.
Quanto a mim, sorrio com tristeza ao ver que entrei finalmente no clube desses caras que tanto admiro. Pena que foi pela porta dos fundos, ou melhor, da sala de cirurgia.

Bendita ciência
Ainda sobre joelhos (desculpem, não consigo pensar em outra coisa): dois avanços tecnológicos das últimas décadas poderiam ter alongado a carreira e diminuído o sofrimento de craques do passado: a artroscopia e a ressonância magnética. Antes delas, os médicos, sem saber bem o que tinha o paciente, não hesitavam em arrancar-lhes os meniscos.

Toc, toc, toc
No Carnaval paulistano, enquanto a corintiana Gaviões da Fiel, campeã do ano passado, foi rebaixada, a palmeirense Mancha Verde venceu a "Segundona" e subiu para o grupo especial das escolas de samba. O paralelismo com o futebol é apenas simbólico, claro. Mas não custa nada aos corintianos bater três vezes na madeira.

E-mail jgcouto@uol.com.br


Texto Anterior: Motor - José Henrique Mariante: Quem ri por último?
Próximo Texto: Tênis: Na final, Guga desafia hoje maior jejum
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.