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Contra o Pan, padre acende tocha da fome
Antônio Gaudério/Folha Imagem
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Em meio a crianças da periferia de Santo Domingo, o padre Rogelio Cruz mostra a 'tocha da fome' |
Líder de comunidade carente em Santo Domingo, Rogelio Cruz critica gastos com Jogos em um país pobre
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EDUARDO OHATA
GUILHERME ROSEGUINI
JOÃO CARLOS ASSUMPÇÃO
ENVIADOS ESPECIAIS A SANTO DOMINGO
Suas únicas armas são dois latões enferrujados. E, mesmo assim, ele se tornou uma das figuras
mais temidas pelos dirigentes que
organizam o 14º Pan-Americano.
O responsável por esse alvoroço
é um padre de 44 anos que lidera
uma comunidade na periferia de
Santo Domingo. Seu nome é Rogelio Cruz, e sua idéia é simples:
mostrar que os Jogos estão escondendo as falcatruas políticas e a
pobreza em que vive a população.
Para trazer os holofotes às teses
que defende, ele bolou uma forma
pitoresca de protestar. Sobrepôs
duas velhas latas, improvisou
uma pira no topo e batizou a engenhoca de "tocha da fome".
"Ela será acessa no dia 1º, com a
tocha do Pan. Vamos mostrar que
o nosso país está à beira de uma
explosão social, que o governo é
mafioso e que o Pan é um evento
feito só para os poderosos", disse.
Cruz explica que vai percorrer
os bairros mais carentes da cidade
durante os Jogos, que vão de 1º a
17 de agosto. E, em cada parada,
quer trabalhar três objetivos.
O primeiro é de caráter educativo. Pretende dimensionar tudo o
que foi despendido no Pan. "Vamos falar sobre quantos medicamentos poderiam ser comprados,
quantos hospitais construídos e
quantas escolas reformadas com
os US$ 158 milhões que o governo
torrou nos Jogos", conta ele.
A segunda parte será dedicada à
recreação. Cruz vai promover pequenas partidas esportivas. "Jogaremos com nossas roupas velhas e
nossos tênis rasgados, em contraponto à ostentação dos atletas."
Por fim, as visitas culminarão
em eventos culturais. O padre deseja convocar artistas dos bairros
para cantar, tocar instrumentos e
promover danças folclóricas.
Trajando calça jeans, camiseta e
tênis All-Star, ele planeja toda essa
peregrinação em um acanhado
escritório no bairro Cristo Rei, na
periferia de Santo Domingo.
Esta não é é a primeira vez que o
sacerdote bate de frente com as
autoridades. Apesar de ter apoiado o atual presidente, Hipólito
Mejía, na época do pleito eleitoral,
Cruz já entrou em outras discussões com o governo. E, por conta
disso, diz sempre estar sendo repreendido. "Em Cristo Rei vivem
103 mil pessoas. Aqui não tem
hospital, não tem cinema, não
tem nada", afirma o sacerdote.
Ordenado padre em julho de
1990, trabalha no local há dez
anos. Sem ajuda do governo
-como faz sempre questão de
frisar-, construiu uma associação comunitária que oferece aulas
de informática, marcenaria, teatro e música. Mas o governo diz
não ser bem assim. Mejía afirma
ter construído casas na região, enquanto a polícia considera o padre um agitador e chegou a acusá-lo de participação em sequestro.
Cruz nega tudo.
E vai além. Conta que sofreu um
atentado há um mês e foi salvo
por Tony Estrella, que coordena a
parte cultural de Cristo Rei, e acusa: "Quem tentou me matar era
policial. Aqui, 60% da polícia é
composta por bandidos".
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