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FUTEBOL
Um papo sobre o futebol
TOSTÃO
COLUNISTA DA FOLHA
Na semana passada, após 30
anos, bati um longo papo
com Carlos Alberto Parreira. Em
1970, ele era auxiliar da preparação física da seleção brasileira e
observador de Zagallo.
Parreira assistiu à partida semifinal da Itália contra a Alemanha
e fotografou todos os detalhes do
jogo. Depois, participou ativamente da preleção antes da partida final. Relatou e mostrou como
era a marcação individual dos
italianos, o posicionamento do líbero e outros detalhes.
Daí, decidiu-se que eu jogaria
junto ao líbero, evitando que ele
saísse na cobertura dos outros zagueiros. Jairzinho levaria seu
marcador Fachetti para o meio, e
o lateral Carlos Alberto aproveitaria esse espaço.
O quarto gol do Brasil foi a fotografia desse planejamento. Nada
funcionaria se Pelé não tivesse a
sabedoria de esperar uma fração
de segundo para empurrar levemente a bola para o Carlos Alberto finalizar.
Apresentei-me à seleção atrasado, por causa da cirurgia no olho.
Fiz treinamentos especiais e somente próximo à Copa entrei no
ritmo da turma. Nessa preparação isolada, Parreira foi meu
companheiro e instrutor. Treinávamos e conversávamos. Hoje, diriam que era meu "personal trainer". Chique, não?
Trinta anos depois, continuamos o papo. Parreira ainda é o
mesmo: estudioso e apaixonado
pela ciência do futebol.
Concordamos e discordamos de
muitas coisas. Por exemplo: o técnico prefere que sua equipe se posicione defensivamente, feche os
espaços, como em 70 e em 94, para depois desarmar o adversário.
Hoje, prefiro a marcação por
pressão em todas as partes do
campo. Pelo menos durante uma
parte do jogo. Sei que é impossível
fazer isso durante toda a partida.
Se não participarem todos,
abrem-se grandes espaços na defesa.
Parreira me deu várias publicações escritas por ele e por treinadores e estudiosos de todo o mundo. Estou lendo, aprendendo e me
deliciando, principalmente com a
história e a evolução do futebol.
Aos poucos, passarei algumas
informações e opiniões aos leitores. Já deu para perceber que o futebol começou com o goleiro e dez
no ataque. Aí, apareceram os técnicos estudiosos e viraram a
prancheta de cabeça para baixo.
Há alguns anos, a maioria das
equipes recuava com os dez jogadores para seu campo. Uma esperava a outra para utilizar o contra-ataque. Como ninguém arriscava, quase nada acontecia.
O futebol ficou horrível e improdutivo. Daí, a vitória passou a valer três pontos. Foi a salvação. Os
times passaram a avançar e a
pressionar.
Ainda não deu para colocar os
dez no ataque, como no início,
mas, pelo menos, uns sete, como
faz a seleção argentina.
Na conversa com Parreira e pelas estatísticas dos livros, aprendi
que quando a bola está em movimento o gol nasce, especialmente
porque o adversário não pressiona o jogador que está com a bola.
Isso reforça minha preferência pela marcação por pressão.
Aprendi também que quase
40% dos gols saem de bolas paradas. Fiquei assustado. Entendi
porque os técnicos brasileiros treinam tanto essa jogada. Só pensam nisso! Pelo menos estão lendo, o que é muito importante.
O futebol brasileiro está imitando o antigo futebol inglês. Cruzam a bola na área, cabeceiam ou
atrapalham o goleiro, e a bola espirra para alguém fazer o gol. Isso
os britânicos chamam de pequeno gol. Pequeno e feio. Deveria
valer metade.
Meu lado racional e pragmático
chegou à triste e verdadeira conclusão de que bom cruzador e cabeceador são, frequentemente,
mais eficientes do que dois habilidosos e criativos atacantes.
Por outro lado, minha porção
lúdica, estética, sonhadora e de
cronista esportivo diz que vale
muito mais um belíssimo gol, de
dribles, passes e tabelas, do que
dois de bolas cruzadas.
Por causa dessa dualidade, os
comentaristas e técnicos não se
afinam. Os treinadores só pensam
em vencer. De qualquer maneira.
O compromisso do crítico não é
com a vitória e sim com o talento,
com a ética e com beleza do futebol. As duas visões são necessárias.
Os torcedores, principalmente
os do Atlético-MG, estão se perguntando de que adianta o Parreira ter tanto conhecimento teórico se não deu jeito no time.
Nem sempre quem sabe a teoria
faz, mas, quem não sabe, nunca
faz.
Na média das atuações em sua
carreira, Parreira teve mais acertos do que erros. Mostrou que,
além de teórico, sabe ser prático.
Além disso, em todas as profissões -e no futebol- existem dezenas de fatores envolvidos no resultado final. O técnico é um deles. Não devemos supervalorizá-lo na vitória nem na derrota.
Um técnico não pode ser mais
importante do que os 11 jogadores. Nem do que um craque.
E-mail
tostao.folha@uol.com.br
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