São Paulo, domingo, 29 de novembro de 1998

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De abalar o coração

ALBERTO HELENA JR.
da Equipe de Articulistas

Bem, se essas semifinais seguirem o mesmo padrão emocional da sessão anterior, haja coração! E tudo indica que vão mesmo seguir.
Lusa e Cruzeiro, por exemplo, foram as duas equipes que, na rodada decisiva da fase anterior, levaram essa questão ao paroxismo. A Lusa perdeu a classificação faltando sete minutos, o que bastou para recuperá-la. O Cruzeiro, por sua vez, conseguiu, no último minuto, transformar a ruidosa festa verde, em pleno Parque Antarctica, num funéreo silêncio de despedida de milhares de palestrinos perplexos.
Não sem antes, porém, ter permitido ao adversário celebrar a certeza da classificação, na mais cruel das situações: pior do que não passar pela porta da esperança é ter de voltar por ela no instante derradeiro.
Assim, quem se arrisca a dar um palpite sobre a nova decisão em três tempos que começa hoje, no lusco-fusco dos interesses da televisão?
Claro que o Cruzeiro pratica um futebol mais fluente e refinado do que a Lusa e ainda por cima joga em casa. Mas joga sem Valdo, que é o sábio e paciente artesão desse time
Em contrapartida, os rubro- verdes vivem ainda a eterna lua-de-mel com seu técnico Candinho, e lá estão Evair, Simão, o menino Leandro, o veterano Aílton, Carlinhos, todos jogadores de bom nível técnico que se fundem num só rosto.
O negócio é esperar.
Santos e Corinthians, na Vila? Ai, ai, ai, ai, ai. No mínimo, vai precisar de uns dez mil soldados da PM ao longo de toda a estrada, pelas cercanias do estádio e lá dentro. Mesmo porque, se o Corinthians é líder e chega repleto de craques de seleção, sem contar o técnico Luxemburgo, que, ainda por cima, deixou na Vila fundos ressentimentos, o Santos de Leão é um time de pura vibração.
E tem o Viola que tanta falta faz a esse Corinthians que o projetou.
Se um estivesse na roda e o outro chegasse, meses sem se verem, não havia nem oi, nem como vai. Era como se continuassem de onde pararam, minutos antes. Um soltava os primeiros versos do samba antigo: "Tens a graça das abelhas/Um olhar, interrogação". E o outro completava: "Onde o til das sobrancelhas/ É o til da palavra não".
Essa era a senha para que desfilassem em seguida todo o repertório de sambas e valsas do Caboclinho Querido, paixão mútua. As outras? Futebol e mulher bonita. Cavalinhos e apostas, qualquer aposta, era com ele. Um profissional, como ia repetindo ao ouvido do amigo, enquanto se dirigiam para o Cassino de Mar del Plata, numa noite da Copa de 78.
Lá, é de lei não dar palpite. Isso é coisa de amador. E eu, calado, mesmo quando já diante da roleta via crescerem as minhas fichas. Foi quando o número 16 cintilou diante de mim, e comecei a empurrar todas as fichas, lance cortado pelo seu grito ao lado: "Não! Tá louco!". Jogo feito, 16.
Eu fiquei com as minhas fichas, que logo se evaporaram, enquanto ele amargava a mais profunda depressão. Isso perdoei na hora.
Só não perdôo o Ely Coimbra por esse seu último lance: ir trocar versos com o próprio Sílvio Caldas lá em cima. Mas uma hora a gente se vê.
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Alberto Helena Jr. escreve aos domingos, segundas e quartas-feiras


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