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GRUPO C/ ONTEM
Didática de técnico consiste em usar e abusar de estilo que o consagrou nos clubes
Grito, puxão de orelha, careta e ironia; é o treino de Scolari
FÁBIO VICTOR
FERNANDO MELLO
JOSÉ ALBERTO BOMBIG
SÉRGIO RANGEL
ENVIADOS ESPECIAIS A ULSAN
A placidez do fim de tarde
oriental é quebrada por um grito:
"Central, zagueiro, central!". Os
coreanos, que à beira do gramado
acompanham o treino da seleção
brasileira, se entreolham com pequeno sorriso preso nos lábios.
Pouco depois, um novo berro,
desta vez impregnado de forte sotaque gaúcho: "Se tu não correr,
não vai alcançar a bola nunca.
Vai". Luiz Felipe Scolari, o autor
da gritaria, é tão delicado ao dirigir um treino do time nacional na
Coréia do Sul quanto um elefante
em uma loja de cristais.
O técnico do Brasil mantém no
comando da seleção, a três dias da
estréia na Copa, o estilo que o
consagrou nos clubes pelos quais
passou, repleto de gritos, puxões
de orelha, caretas e muita ironia.
Scolari é detalhista no comando
do treino, chega a ser exaustivo.
Pára as jogadas, repete uma, duas,
três, quatro vezes, sem se importar com a cara feia dos atletas.
"Vamos lá, sem moleza, tem que
fazer de novo", afirma ele.
Com diploma de educação física, Scolari é um dos poucos técnicos que podem, literalmente, ser
chamados de professor. Sua didática é, no mínimo, antiquada. Ele
explica uma vez, o jogador abaixa
a cabeça e tenta fazer como o técnico pediu. Se errar de novo, não
tem segunda chance, é bronca.
Foi o que aconteceu com Roberto Carlos, um dos astros do time,
quando o técnico ensaiava jogadas de cobrança de lateral. O aluno, no entanto, mandava a bola
sempre no mesmo lugar. Scolari
pediu que ele mudasse, não foi
atendido. Aí, disparou: "Vai, joga
aqui de novo. O Dida [goleiro reserva" já está esperando. Só ele e o
goleiro da Turquia sabem que você vai mandar essa bola aqui".
O treinador dita as regras até
nos intervalos para a sagrada
água dos atletas. Quem não está
com sede tem que beber do mesmo jeito. "É uma coisa científica",
berra para o grupo na tentativa de
justificar a imposição.
Vez ou outra, quando não consegue se controlar, o técnico explode em um palavrão, como na
última terça-feira, quando chegou a ser repreendido por um
membro da comissão técnica.
Os atletas dizem que já aprenderam a trabalhar com Scolari e
seu jeito durão. "É uma pessoa
com quem eu me adaptei a trabalhar. O cara que não faz nada errado não vai ter problema em trabalhar com ele", afirmou Luizão.
"Cada um tem uma forma de
assimilar os métodos do treinador. Acho que a gente tem sempre que olhar essas broncas como
incentivo", disse Gilberto Silva,
um dos mais novos do time. "Ele
é carismático", completa.
Scolari também faz troça. Ao
ver Roberto Carlos dizendo que
pode chegar com facilidade a
uma bola lançada na esquerda,
diz: "Tu pega uma ova".
E dá aulas a Lúcio sobre o posicionamento no momento em que
o adversário cobra escanteios. O
ex-zagueiro do Caxias e de outros
clubes pequenos do futebol brasileiro não titubeia ao proferir suas
lições ao zagueiro do Bayer Leverkusen (Alemanha), um dos
mais festejados da Europa.
Em seu passado de jogador,
Scolari ficou conhecido como
"roscão" porque só acertava a bola com efeito. Contudo ele parece
não se importar, e os craques da
seleção têm que ouvir calados
seus ensinamentos.
A noite cai em Ulsan, o treino
segue, e com ele a gritaria. "Ronaldo, vai para a ponta quando o
Rivaldo cair pelo meio, porra!" O
jogador da Inter de Milão concorda com a cabeça.
De repente, a voz de Scolari é
ofuscada. Todos olham assustados. Não, ninguém gritou mais
alto que ele, foi só um forte trovão
que ribombou no céu.
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