|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Música on-line paga quer ganhar corações e mentes
O império contra-ataca
France Presse
|
Homem empilha CDs e DVDs falsificados antes de eles serem destruídos na China |
GUILHERME WERNECK
DA REPORTAGEM LOCAL
Primeiro foi o MP3. Depois, o Napster e
as redes de troca de arquivos P2P
(ponto a ponto), como o KaZaA e o SoulSeek. Agora, ao desprender-se dos computadores, a música digital passa por
uma nova revolução.
A popularização dos tocadores de MP3
e de aparelhos portáteis que armazenam
e tocam música digital em diferentes formatos -como o iPod e o Dell Digital Jukebox (só para citar os líderes do mercado norte-americano)- e a experiência
lucrativa de serviços pagos de download
de música pela internet nos Estados Unidos começam a apertar a corda no pescoço do bom e velho CD.
Uma diferença dessa revolução é que
desta vez a indústria não foi pega de calças curtas por garotos como Shawn Fanning, que criou o Napster aos 19 anos.
Na realidade, o comércio digital de
canções ganha força com toda a pressão
que a indústria de discos vem fazendo ao
processar pessoas comuns que trocam
música pela internet nos EUA.
No 38º Midem-a maior feira da indústria fonográfica-, que aconteceu na
semana passada em Cannes (França), a
música digital roubou todas as atenções
e não foi vista como o bicho-papão que
alimentava a pirataria e se alimentava da
queda de vendas de CDs no mundo todo.
Segundo a diretora do evento, Dominique Leguern, a indústria caminha para
uma "desmaterialização do suporte"
[leia-se, o fim do CD], uma tendência
apontada pelos Estados Unidos e que deve desembarcar rapidamente na Europa.
Leguern não subestima o poder da troca livre de MP3, mas vê na experiência
norte-americana do iPod (que usa músicas do iTunes num formato que ainda
não permite cópias sem controle) uma
solução eficaz de combate à pirataria.
"Toda uma geração tem consumido música sem pagar por ela. Agora, temos de
mudar essa tendência. Não podemos tolerar que músicos não obtenham nada
por seu trabalho", disse.
No mundo digital, o Midem tocou em
duas teclas: a distribuição de canções via
telefones celulares, popular na Ásia, mas
ainda fraca no resto do mundo, e o boom
dos serviços pagos de troca de música.
O iTunes, que saiu na frente dos concorrentes, tornou-se o espelho da virada.
Desde abril de 2003, o serviço da Apple
que disponibiliza mais de 500 mil músicas vendeu 19,2 milhões de canções, a
um preço de US$ 0,99 cada uma, apenas
nos Estados Unidos. Nos últimos anos,
eram vendidos uma média de 12 milhões
de "singles" (compactos) no país.
Esse mercado cresceu ainda mais nos
EUA com a volta do Napster (como um
serviço pago), em outubro do ano passado, e com a entrada no jogo de uma
grande rede de varejo, a Wal-Mart.
No Midem, o executivo do Napster
Chis Gorog disse que, "ao gravar um CD
ou ao usar um aparelho de áudio digital,
a música começa a chegar à sala de estar", mas afirmou que espera o "Santo
Graal que levará [os ouvintes] a conectar
seus computadores ao som de casa".
Gorog anunciou que outra grande mudança no mercado deve ocorrer em
agosto deste ano, quando a Microsoft introduzir um serviço de música que permitirá aos consumidores pagar uma assinatura para baixar músicas, como alternativa ao modelo de comprar cada
canção, adotado hoje pelo iTunes e pelo
Napster. Esse tipo de serviço, contudo,
não é novo. Desde 2000, a comunidade
Vitaminic já disponibilizava música on-line por assinatura.
Durante o Midem foi lançado no Reino
Unido um serviço de venda de músicas
similar ao iTunes, o MyCokeMusic, criado pela Coca-Cola com tecnologia da
empresa OD2, que tem o ex-Genesis Peter Gabriel como um dos sócios. Além de
ser pioneiro na Europa, o programa é
um marco por se tratar da entrada de
uma grande marca numa briga que se
restringia à indústria fonográfica.
Mas a ação da Coca não é tão pioneira
assim. Nos EUA, a Pepsi fez um acordo
com o iTunes para dar a seus consumidores 100 milhões de downloads gratuitos. Com isso, as empresas querem ganhar um público que vai dos 13 aos 23
anos. Ou seja, você, que, além de estar na
faixa etária que mais consome música,
também é chegado num refrigerante.
A idéia é ganhar "corações e mentes"
dos consumidores. Expressão usada nos
discursos anticomunistas que pregavam
o mesmo tipo de sedução racional/emocional durante a Guerra Fria.
Mas quem usa corações e mentes na
produção de música vê também uma revolução mais profunda, que pode levar à
lona a combalida indústria de discos.
No Midem, Peter Gabriel e o produtor
Brian Eno lançaram a Mudda, uma associação de artistas que gerenciariam as
suas músicas digitalmente sem usar gravadoras nem selos. "Nós disponibilizaremos o processo de criação, não um produto. Dessa forma você pode tornar a
música acessível no formato que escolher, ao preço que decidir", disse Gabriel.
"O CD nos forçou a fazer música de uma
determinada maneira. Não podíamos
lançar peças de quatro minutos nem
uma série de 151 minutos porque não fazia sentido economicamente. On-line
você modifica isso. É hora de o artista dizer o que quer", afirmou Eno.
Só o tempo dirá se serão as grandes indústrias ou os grandes artistas que prosperarão no futuro binário. Mas é inegável que a música on-line estará lá.
Com agências internacionais
Texto Anterior: Música: Em busca da batida perfeita Próximo Texto: Tumate põe fim à bagunça dos arquivos Índice
|