São Paulo, segunda, 3 de agosto de 1998

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Boi Mamão faz ska com ironia em novo CD

JULIANA MONTEIRO
Divulgação
Integrantes da banda paranaense Boi Mamão


free-lance para a Folha

"Não seja ateu, reze para o rock. Ele pode te salvar." Com essa frase Glerm (Guilherme), vocalista e letrista do Boi Mamão, sintetiza a atitude da banda que acaba de lançar o seu primeiro CD por uma grande gravadora, a Paradoxx.
"Compre, Grave ou Roube" é o sugestivo nome do disco que, com seu skacore adolescente, resgata o comportamento punk, uma das grandes influências do grupo.
"Não somos uma banda exclusivamente de ska, o disco é que saiu assim", fala o vocalista. "O nosso negócio é o rock and roll e tudo pode nos influenciar, de Frank Zappa a Hermeto Paschoal. Ninguém sabe como serão as nossas próximas músicas."
O Boi Mamão faz parte de uma geração de bandas que segue a linha "quanto maior a mistura de estilos, melhor". "A nossa proposta é fazer rock pauleira, com energia; misturar tudo com a da malandragem brasileira e estar sempre antenado com as coisas que acontecem no mundo."
Sem ter um estilo musical definido, que pode ser o hardcore, o ska, ou o velho rock and roll, Glerm faz questão de ressaltar uma característica constante das letras do Boi Mamão: "A ironia, esse é o nosso estilo literário."
Com ares de trovador (pesquisar história da literatura portuguesa pré-vestibular, no tópico "cantigas de escárnio"), ele fala da malícia de dizer uma coisa por outra e assim fazer críticas aos acontecimentos a sua volta.
"Compre, Grave ou Roube" traz 17 músicas; 16 originais e uma regravação do clássico "Surfista Calhorda", dos Replicantes. E as letras, realmente, abusam da sátira para falar das situações cotidianas. Em faixas como: "Uma Cervejinha", tiram uma da hipocrisia em torno da maconha. Em "Pare de Hipnotizar Minha Vó", atacam a letargia causada pela televisão. E em "Capeta é Você", criticam a salvação vinda do céu.
"A gente quer fazer as pessoas enxergarem como certas coisas são ridículas. Alguns acontecimentos me revoltam e escrever as músicas foi a melhor forma de extravasar a impotência que eu sinto diante disso", diz Glerm.
O Boi Mamão foi formado em 92, em Curitiba (PR) e, de lá pra cá, já se apresentou em "todos os buracos do cenário alternativo da música brasileira", conta. "No começo da década de 90 surgiu um movimento legal de bandas independentes em Curitiba, a gente entrou nessa e, entre altos e baixos, sempre conseguimos continuar na estrada."
Com sete anos de bagagem, eles têm história. Em 93, o selo curitibano Bloody, de vida curta, lançou um vinilzinho compacto, o primeiro álbum da banda. No ano seguinte, a extinta gravadora Banguela Records lançou a coletânea "Alface", da qual a banda fez parte; participaram do lendário festival Juntatribo, ao lado de bandas como Planet Hemp e Câmbio Negro; e gravaram o videoclipe da música "Cão Kkranildo", dirigido pelo mestre dos filmes B, Zé do Caixão. O primeiro CD, o independente "Ska com Paulera" saiu em 96. "E no meio de todo esse tempo, milhares de demos", conta o saxofonista Rodrigo.
O nome, Boi Mamão, foi emprestado de um personagem do folclore sulista. "Andando na rua a gente encontrou um folheto sobre um festival, o boi-de-mamão, que é o bumba-meu-boi gaúcho. Nós achamos o nome legal e colocamos na banda, sem maiores pretensões", explica Glerm.
Agora, de contrato fechado com uma grande gravadora, qual a maior ambição da banda? "Ter um público cada vez maior, que entenda e se identifique com a gente. E é claro, evoluir dentro da música e ser reconhecido por isso. Não queremos ser pop stars."
Enquanto o reconhecimento do grande público não chega (em Curitiba já tem gente com camiseta da banda), o grupo é incapaz de pagar as contas. Todos os integrantes (Nillo, guitarra; Lúcio, baixo; Renê, bateria; Rodrigo, sax; Luís Jiraya, trombone, e Ricardo Boi, trompete) possuem atividades paralelas, de desenhista de quadrinhos a farmacêutico. "É isso aí. Infelizmente, fazer música no Brasil nunca deu grana", diz Glerm.
Todos os sete integrantes estão na idade dos 20 e poucos anos. "Tornar-se adulto realmente muda a nossa visão do mundo, as responsabilidades e tudo mais. A maioria das pessoas começa a ficar mais velha e passa para o lado de lá, o lado da "direita'. A gente não quer deixar o conformismo tomar conta, queremos sempre ser moleques, ter a capacidade de se revoltar. Isso é o rock "n'roll, não é?!"
Glerm faz críticas à falta da cultura do rock no país que, segundo ele, seria uma das formas de exercitar a contestação.
Ele aproveita para mandar uma mensagem para os leitores do Folhateen: "Existe rock no Brasil, tem muita banda boa por aí, só depende de vocês a chance de manter isso."



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