São Paulo, segunda-feira, 08 de março de 2004

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O rock é cheio de mistérios e grandes figuras

ÁLVARO PEREIRA JÚNIOR
COLUNISTA DA FOLHA

O mundo do pop-rock adora lendas e mistérios, do tipo... Keith Richards só está vivo por causa de seguidas transfusões integrais de sangue. Paul McCartney morreu nos anos 60. O vocalista de um grupo progressivo arrancou os testículos para cantar mais fininho. O Led Zeppelin participou de uma orgia que envolvia os caras da banda, várias fãs e um tubarão morto (essa parece que é verdade, só que o peixe não era tubarão). Raul Seixas foi visto comprando camisetas na Galeria do Rock, em São Paulo. Elvis não morreu.
Pois, agora, mais um desses mistérios insondáveis ganha corpo entre os fãs de rock, um enigma chamado Jandek (pronuncia-se "Djéndék").
Você nunca ouviu falar no cara, imagino. E muito menos eu tinha ouvido, até dias atrás, quando li uma reportagem no "Los Angeles Times" sobre o documentário "Jandek on Corwood", que trata dessa figura.
Desde 1978, Jandek lançou 35 álbuns (!). Só deu uma entrevista, em 1985. E, ainda assim, não se sabe se foi ele mesmo o entrevistado.
As capas dos discos também não dizem nada. Trazem fotos mal focadas de peças de mobília. Alguns discos exibem a foto de um jovem (parecido com o Beck) segurando uma guitarra. Mas ninguém sabe se o rapaz é Jandek e, mesmo se for, é impossível dizer se a fotografia é atual.
Segundo a descrição do "Los Angeles Times", a música de Jandek consiste unicamente na voz dele, trêmula, sobre uma guitarra ou violão de afinação tosca. Para quem já ouviu, não há meio-termo: ou é a coisa mais emocionante ou a mais insuportável do universo.
Escutei uma única canção desse maluco: "They Told me I Was a Fool". Se você tiver um violão ou uma guitarra em casa, saia tocando e cantando qualquer coisa por cima. Dá no mesmo.
O documentário se chama "Jandek on Corwood" porque Corwood Industries é o nome da gravadora pela qual Jandek lança suas obras. Trata-se de um selo próprio, não precisava nem dizer.
Os diretores do filme, Chad Freidrichs e Paul Fehler, não fizeram a mínima questão de tentar imagens "roubadas" de Jandek. Pelo contrário.
Quando foram à cidade de Houston filmar a caixa postal que serve de endereço para a Corwood Industries, eles até mandaram um alerta a Jandek: "Olha, nós estaremos em frente a sua caixa postal no dia tal, na hora tal. Se você quiser nos conhecer, apareça e não se preocupe, a gente não vai filmá-lo. Mas, se você não quiser encontrar a gente, então nem chegue perto". Claro que Jandek não apareceu.
O documentário mostra fãs e críticos de música obcecados por Jandek. Os mitos em torno dele são inúmeros. Que é um rico industrial só tirando uma onda. Que é um solitário que nunca sai de casa. Que gravou centenas de horas de música num período de loucura nos anos 70 e lança tudo aos poucos. Que a foto que aparece em certos discos não é de Jandek , mas de um irmão que morreu.
Não disse que o pop-rock adora mistérios? Confira: www.jandekoncorwood.com.


Álvaro Pereira Júnior, 40, é editor-chefe do "Fantástico" em São Paulo
E-mail: cby2k@uol.com.br



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