São Paulo, segunda, 10 de maio de 1999

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Mau uso da Internet pode dar cadeia

FÁTIMA GIGLIOTTI
da Reportagem Local

O que pode parecer uma "inocente" brincadeira para burlar o pagamento da taxa de acesso ao provedor com dados falsos, de telefone, RG ou CIC, é crime e pode levar o engraçadinho a pagar multa e parar na prisão.
Na Internet, há infrações muito menos "inocentes" do que essa, que vão de receitas de bomba a listagem de programas de invasão (confira texto nesta página).
São tantas infrações que já ganharam até nome: crimes digitais ou de informática. Já existe inclusive uma técnica que faz o "retrato falado" do suspeito com base nos e-mails ou na home page. "Tem dado certo", diz o delegado Mauro Marcelo de Lima e Silva, da Divisão de Informações da Polícia Civil (São Paulo).
Foi com o "retrato falado" e outras "iscas virtuais" que ele chegou ao autor das ameaças, feitas por e-mail, a duas conhecidas jornalistas de São Paulo. Depois, obteve autorização judicial para apreender o computador do cara. Diante disso, só lhe restou a confissão.
A pena para o crime de ameaça (artigo 147 do Código Penal) é de um a seis meses de detenção ou pagamento de multa.
Investigação policial
A investigação começa a partir de uma denúncia anônima feita à polícia, a ONGs (organizações não-governamentais) ou à Abranet (Associação Brasileira de Provedores de Internet), da informação de outras polícias, nacionais e internacionais, ou por diligência virtual (simples navegação).
A materialidade do crime é provada com cópias da home page ou dos e-mails denunciados, por exemplo. Depois, se o provedor for nacional, com uma ordem judicial a polícia obtém as informações sobre o autor, retira a página do ar e manda o inquérito para a Justiça. Se o infrator é menor de idade, o inquérito é enviado para o Juizado da Infância e Juventude.
Se o provedor for internacional, a operação é mais complicada, mas a polícia já desenvolveu alguns métodos para identificar o autor. Foi por meio deles que o delegado identificou E.C., 15 anos, como o autor do site pornográfico duda e rafa's page, "pendurado" no provedor americano xoom.com.
Todo mundo sabe que ainda não existem leis para regulamentar o uso da Internet. Mas o delegado Silva afirma que os crimes digitais podem ser adequados à legislação penal já existente (confira ao lado).
Código de ética
O artigo 286 do Código Penal, por exemplo, diz o seguinte: "Incitar, publicamente, a prática de crime: pena - detenção de três a seis meses". Isso significa que ensinar a fazer bombas, a destruir carros, a fraudar o pagamento de conta de celular compromete quem faz e quem incita o crime, divulgando na sua home page, por exemplo.
Com base nisso, imagine. Se o americano Eric Harris, um dos responsáveis pelo massacre na escola Columbine, em Littleton, Colorado (EUA), que tinha uma home page com receitas de bomba, tivesse sido punido logo no início, talvez não terminasse tão mal.
É justamente para prevenir o mau uso da rede, principalmente relacionado à pornografia, ao racismo e aos sites que estimulam a violência, que a Abranet, em parceria com a promotoria da capital, promete para este mês ou começo de junho um acordo de cooperação entre os provedores.
Segundo o presidente da Abranet, Antônio Tavares, os provedores devem estabelecer um contrato-padrão para os usuários com cláusulas preventivas e que estabeleçam a responsabilidade pelo uso da Internet. "Será como um código de ética, uma lei informal que todos têm de respeitar", diz Tavares.
"A idéia é formar uma lista negra com os infratores e disponibilizá-la por meio da Abranet", afirma Maurício Ribeiro Lopes, da Promotoria de Justiça da Infância e Juventude da capital. Mas ele reconhece que o controle do uso da Internet é tecnicamente complicado "porque coloca numa mídia eletrônica a liberdade de pensar".
Para Tavares, o funcionamento anárquico da rede não é fácil de ser controlado, "mas o acordo pretende dar uma certa moralidade e dignidade para os usuários que criam o que é veiculado na Internet".
Foi também com essa intenção que a Abranet produziu o "Guia de Orientação aos Pais", baseado na experiência do FBI (a polícia federal dos EUA) e adaptado para as famílias brasileiras. A princípio, ele será distribuído nos kits de acesso à rede. Enquanto isso, previna-se com os dez mandamentos do bom uso da Internet, elaborados pelo presidente da Abranet para o Folhateen.




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