São Paulo, segunda-feira, 19 de janeiro de 2004

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Roda-viva

Flávio Florido/Folha Imagem
Looks do desfile da Depeyre no Amni Hot Spot,em São Paulo


Desfiles de jovens estilistas servem de trampolim para as "new faces", ninfetas que alimentam o circo da moda

GUILHERME WERNECK
DA REPORTAGEM LOCAL

"Moda é simplesmente uma forma de feiúra tão insuportável que nós somos obrigados a mudá-la a cada seis meses." Essa frase mal-humorada torna-se engraçada quando se sabe que seu autor, o dândi irlandês Oscar Wilde (1854-1900), foi precursor do que se convencionou chamar de "vítimas da moda".
Se, por um lado, a sede por novidades a cada seis meses não muda desde a Inglaterra vitoriana (1837-1901) de Wilde, por outro, na ditadura da imagem de hoje, não são só as roupas que precisam de renovação periódica. Os rostos também.
Assim, o circo da moda que se instalou em São Paulo desde a semana passada com os dois maiores celeiros de novos estilistas -a sexta edição do Amni Hot Spot e a 15ª Semana de Moda Casa dos Criadores-, apresenta também uma boa amostra das "new faces", as modelos que prometem dar o que falar nesta e nas próximas temporadas.
Em três dias, o Amni Hot Spot mostrou as coleções de inverno 2004 de 15 marcas de jovens estilistas. Nos bastidores do primeiro dia de desfiles, na última quarta-feira, mais do que as novíssimas criações penduradas nas araras à espera de ganhar corpos na passarela, chamava a atenção a infinidade de garotas e garotos pouco conhecidos, que, maquiados e penteados, esperavam, um tanto nervosos, a sua vez de aparecer.
Eles sabem que é nos desfiles dos novos criadores que está a chave para deslanchar na carreira e conseguir visibilidade para dar o passo seguinte: desfilar na SP Fashion Week, que acontece de 28 de janeiro a 3 de fevereiro.
Ainda começando a carreira, Lucy Horn, 14, deixou a cidade de Estrela, no Rio Grande do Sul, para desfilar para Erica Ikezili no Hot Spot.
"Antes deste desfile, tinha vindo só quatro vezes a São Paulo. Desta vez, também fiz vários castings [testes de seleção] para o SP Fashion Week e espero conseguir entrar nos desfiles", conta a gaúcha, que planeja mudar para São Paulo no ano que vem, depois de terminar a oitava série.
Aline Thielke, 13, de Condor, também no Rio Grande do Sul, compartilha a mesma vontade de vir para São Paulo no próximo ano. Depois de fazer o desfile que considerou o "mais importante" de sua carreira na quarta, ela já pensa no futuro com uma certa apreensão. "Não sei se eu vou agüentar ficar longe da família", sofre por antecipação.
As duas dão uma boa amostra de uma obsessão no mercado de modelos: as ninfetas. Para Renato Júnior, 35, booker da agência Elite, o interesse dos estilistas por garotas novas se dá porque elas ainda não têm uma personalidade definida. "Eles gostam porque o que aparece mais é a roupa. Ninguém fica reparando em como ela está andando, como a roupa ficou nela, essas coisas", diz.
O stylist (produtor) Rogério S., 38, responsável por dois desfiles para a Fashion Rio, vai além: "A obsessão do mercado existe porque, quando elas são novinhas, têm um corpo incrível e um frescor. Mas acho que as ninfetas ficam melhores quando amadurecem, quando começam a transar", arrisca. "Eu também identifico uma tendência no mercado de querer mulher com cara de mulher, não de menina", completa.
A coordenadora do departamento fashion da agência Mega, Laura Vieira, 29, concorda que as modelos melhoram depois que crescem. "Mas o mercado gira dessa forma, as novinhas são lindas, e é essa a hora de começar a formá-las."
Com jeito de mulher e dona de uma beleza clássica, Barbara Berger, 18, que abriu o desfile de Fabia Bercsek no Amni Hot Spot, é uma das apostas do mundo da moda para este ano.
Na última temporada, ela desfilou em Milão, Paris e Nova York e é quase certa a sua presença tanto no SP Fashion Week quanto no Fashion Rio, que acontece de 21 a 24 de janeiro no Rio. Sua receita para brilhar na passarela vai além da beleza e da técnica: "Você tem de se sentir na roupa", diz.
Barbara é modelo desde os 14 anos e, até estar pronta para aparecer, teve de construir um visual, o que nem sempre é fácil. "Sempre quis ser modelo, mas, quando tinha 14 anos, o pessoal da agência em que eu trabalhava quis cortar meu cabelo, que era comprido. Nessa hora, eu quase desisti", conta.

Saldão de beleza
O aparecimento do novos rostos faz girar a indústria da moda, mas explorar a novidade é apenas um dos aspectos dessa operação de reciclagem sem fim.
"A importância das novas meninas é que, com elas, a gente consegue equilibrar o orçamento. A questão da grana é fundamental. É claro que um desfile tem de ter as tops, mas não é possível fazer um desfile só com elas", afirma Rogério S.. "A mesma coisa acontece lá fora, as modelos brasileiras começam a se dar bem porque são opções que pesam menos no orçamento", completa.
Para a estilista Rita Wainer, que irá apresentar a nova coleção da Theodora amanhã na Semana de Moda Casa dos Criadores, que começou no sábado, o casting de modelos tem tudo a ver com o dinheiro que se tem para produzir o desfile. "A gente não tem acesso às modelos que estão bombando", diz.


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