|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
CINEMA
A trilogia da burrice - parte 3
GUSTAVO IOSCHPE
especial para a Folha
Usando de questionamento
em voga nos círculos supostamente pensantes: teria a preguiça intelectual causa genética ou
seria ela aprendida?; "nature or
nurture"? Já que a evolução, por
alguma razão, dotou-nos de cérebro de uma complexidade tremenda e que, ao longo da espécie, produzimos cérebros como
o de um Newton, um Kant, um
Descartes, um Einstein ou um
Freud -pra não citar Itamar
Franco, um mistério da natureza-, somos forçados a admitir
que fomos dotados de capacidade pensante e que, se não a usamos mesmo a sabendo presente,
será por motivo insondável, assim como o não-levantar da
tampa da privada. Genético não
é. Resta-nos o ambiente, até porque ser tão burro com toda essa
massa encefálica requer horas
de esforço, paciência e muita
vontade. Quem seriam então os
responsáveis por esse aprendizado?
Ora, os mesmos que ensinaram a você a permeabilidade seletiva da célula, ou a cor da manga do colete de Napoleão: os
professores.
Nos primeiros anos de aprendizagem, tem-se a impressão de
que os professores são seres sobrenaturais, dotados de sabedoria infinita e paciência idem. À
medida que se cresce, vai-se notando que também os professores se dividem em curva gaussiana, como quase tudo na vida:
uma grande massa de medíocres
(isto é, medianos), cercados por
uma minoria de estupidez total e
outra de brilhantismo absoluto.
E da grande massa de desqualificados, que não conseguem pensar eles mesmos, não se pode esperar que o ensinem a seus alunos.
Como não podem ensinar a
pensar, ensinam a decorar fatos
ou, no máximo, a entendê-los.
Veja que ensinar fatos é quase
inútil: com a infinidade de conhecimentos e a facilidade que
hoje se tem de encontrá-los, ninguém deveria se preocupar em
ensinar nada além de como discernir o essencial do desimportante, como encontrar o primeiro e o que fazer com ele. Sendo
isso inalcançável, a instituição
do ensino transforma-se em
uma reunião de indisposições
coletivas, em que o "mestre" vomita a síntese de seus livros, o
aluno engole e trata de não esquecer, para, alguns meses mais
tarde, vomitar tudo de volta,
num saco pra enjôo chamado
"prova".
Não seria assim tão mal se os
professores pudessem reconhecer o pensamento original e recompensá-lo. Já que não ajudam, que não atrapalhem. Mas
quem quer que já tenha ousado
discordar de um professor -ou,
pior ainda, questioná-lo em seu
templo sagrado, a (rufar de tambores) sala de aula- sabe qual é
o resultado: um redondo zero no
primeiro caso e uma visita à
coordenadora pedagógica por
"problemas de comportamento" no segundo. E, ainda que a
adolescência seja época de grande idealismo, não há rebeldia
que aguente uma sucessão de zeros, pois o sistema impõe a necessidade de um diploma. E um
diploma significa aprender que,
quando um burro fala, os outros
baixam as orelhas, em metáfora
comumente utilizada por professores, quiçá por representar
auto-imagem inconsciente, em
fenômeno que dr. Freud já previra.
A escola torna-se, assim, mecanismo de controle social, onde
à criança é ensinada desde cedo
a adoção do comportamento
dócil e servil, que lhe será fundamental no mundo adulto, quando tiver um patrão em vez de
professor. Nada surpreendente,
aliás, já que a própria escola foi
criada para garantir a uns poucos o conhecimento que lhe permitiria manter uma ordem social hierarquizada. O sistema de
educação massificado é fenômeno só pós-Revolução Industrial,
quando à choldra foi permitido
aprender um mínimo para que
pelo menos operasse as máquinas do patrão direitinho. Desde
o começo e até hoje, a escola -e
seus arautos, os professores-
foi instituição restritiva, e não
disseminadora de conhecimentos, e mais assassinou a criatividade do que a incentivou.
Pouco surpreende que vários
dos grandes gênios tenham tido
problemas com a escola. Thomas Edison foi expulso da sua,
aos 8 anos, por ser "curioso demais". Bendita curiosidade, já
que o moço, alguns anos mais
tarde, inventaria a lâmpada.
Gustavo Ioschpe, 22, é escritor e estuda administração na Wharton School e ciência política na University of Pennsylvania, EUA,
e-mail: desembucha@cyberdude.com
Texto Anterior: Cinema: "Star Wars" sem fila e na madrugada Próximo Texto: Evento Folhateen: Encontre os Engenheiros amanhã Índice
|