São Paulo, Segunda-feira, 21 de Junho de 1999 |
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CAPA Borges, escritor de 100 anos para jovens
da Reportagem Local No dia 24 de agosto, um dos mais importantes escritores deste século, o argentino Jorge Luis Borges, faria 100 anos. Até lá, muito vai se falar do autor de "Ficções" e "O Aleph", considerado o pai da literatura fantástica latino-americana. Você pode perguntar: "Mas e daí?". O ator e estudante Piatã Stocklos Kignel, 18, fez o mesmo há quatro anos, após os ensaios para a peça "Elogios", baseada em textos do escritor. "Nem sempre eu entendia o que o que ele falava e me perguntava: "E daí?". Ele me ensinou que existem coisas que são lindas, e ponto, não têm "e daí'". Borges é o escritor preferido de Piatã, filho da atriz Denise Stocklos, autora e diretora da peça. "Ele é meu guia, um autor surpreendente, mágico, que vê mistério em tudo. Releio sempre que estou com dificuldade porque ele é um símbolo do devaneio, do amor, emoções banalizadas neste mundo competitivo e injusto." A seu modo, Piatã identificou várias marcas da obra do escritor. O articulista da Folha e poeta Nelson Ascher, que começou a ler Borges aos 14 anos, diz que ele, antes de dar respostas, dialoga com o leitor e o ensina a perguntar. "E não impõe a imaginação dele, entra na do leitor e o convida a ampliá-la." Mas Borges também é irônico, diz o psicanalista argentino Ricardo Goldenberg, que era um jovem durante a ditadura do país: "Em 76, eles nos matavam, tenho cinco colegas desaparecidos, e Borges era o único que falava de política". Goldenberg diz que a ironia é um modo de contestar algo ou uma pessoa, por exemplo, sem romper com ela. É interrogar as certezas, "e Borges fazia deboche como subversão". Também usava ironia e deboche para divertir, com idéias, cenas e personagens inusitados. "Ele é um administrador desbragado da fantasia, influenciou gerações de escritores com a idéia de que tudo é ficção, poesia, conto, ensaio e até filosofia." Por isso, completa o crítico literário João Alexandre Barbosa, é preciso se entregar às maluquices de Borges. Apesar de ser um escritor muito culto e erudito, seus livros são povoados de piratas, caubóis, heróis que se aventuram em terras exóticas em épocas remotas. Além de heróis tipicamente argentinos. "Ele transformou em herói o homem simples do subúrbio de Buenos Aires", diz a professora de literatura da pós-graduação da PUC-SP Leda Tenório da Motta. Borges escreveu basicamente ensaios, poesias e contos curtos -"você não tem de encarar 600 páginas", diz Ascher. E tinha fascínio por formas pouco nobres da literatura, como histórias policiais, com jogos de lógica e enigmas. Isso é tão típico de Borges quanto o labirinto, o espelho, o tigre e a biblioteca, que simbolizam, entre outras coisas, o infinito, a duplicidade do homem, um ser contraditório, e a necessidade de saber "ler" o mundo para entendê-lo. "Borges desfez a distância entre o grande escritor e o grande público, e os especialistas ainda tentam entender esse mistério", diz Motta. Para Piatã, é simples. "Ele diz que, às vezes, a gente se entedia com o mundo, achando que já descobriu tudo, mas o mundo é complexo, há sempre o que descobrir". Texto Anterior: Educação: Enem muda prazo de inscrição Próximo Texto: Biografia Índice |
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