São Paulo, segunda-feira, 21 de agosto de 2000


Envie esta notícia por e-mail para
assinantes do UOL ou da Folha
Próximo Texto | Índice

O NOVO CINEMA NOVO

Uma nova geração de cineastas promete sacudir o cinema brasileiro
Rogério Albuquerque/Folha Imagem
Moira e Flavio, alunos da Faap, têm dois filmes no festival de curtas


Eles têm entre 21 e 24 anos, detestam o atual cinema brasileiro e procuram novas formas e linguagens em seus filmes

Cineastas em transe

AUGUSTO PINHEIRO
DA REPORTAGEM LOCAL

O 11º Festival Internacional de Curtas-Metragens de São Paulo, que vai até sábado (26/8) em 11 salas paulistanas, apresenta uma nova geração de cineastas, que não se identifica com a atual fase do cinema nacional e luta contra a dificuldade de produzir filmes no Brasil.
Eles têm entre 21 e 24 anos e ainda frequentam escolas de cinema ou são recém-formados. Para bancar os filmes, pegaram equipamento emprestado da faculdade ou trabalharam para conseguir o dinheiro necessário.
O cineasta Christian Saghaard, 29, do comitê de seleção do festival, vê talento de sobra na turma. "A gente está presenciando uma nova geração de diretores de curtas, uma geração ousada e que se utiliza da estrutura da escola para fazer cinema independente", diz, sobre os cineastas entrevistados pelo Folhateen.
Moira Toledo e Flavio Dezorzi, ambos de 21 anos, que estão no terceiro ano do curso da Faap (Fundação Armando Álvares Penteado), exibem duas produções no festival, "Réquiem" e "A Primeira Vida".
Os dois têm uma pequena produtora, a idvideo. "Fizemos alguns vídeos institucionais para ganhar uma grana e bancar a finalização dos dois filmes", conta Moira. Segundo ela, cada um custou R$ 6 mil.
Moira e Flavio já haviam dirigido alguns vídeos e decidiram fazer os dois curtas para colocar em prática estudos de estética e linguagem, com forte inspiração do diretor baiano Glauber Rocha, expoente do cinema novo.
"O cinema brasileiro parou em 1980, com "A Idade da Terra", do Glauber", dispara Moira. "Os filmes de hoje parecem comercial de Omo. Não existe ousadia. Já que não se alimentam de bilheteria e popularidade, graças às leis de incentivo, os filmes nacionais poderiam ser mais experimentais, mais inovadores."
Em "Réquiem", a dupla de estreantes mostra o "diálogo" de uma mulher com o feto abortado em um banheiro. "Foi a concretização de estudos, como direção de atores. O filme possui menos de dez cortes, o que mantém a unidade dramática", afirma Flávio, que largou o curso de publicidade para estudar cinema.
Já "A Primeira Vida" retrata situações extremas de dois personagens. "Havia um roteiro, mas o filme é mais intuitivo. Queríamos ver o que os atores poderiam oferecer a partir de estímulos", diz Moira.
Outro jovem cineasta, João Carlos Lemos, 22, mostra no festival o curta "Ardil", seu trabalho de conclusão de curso na Faap, que dirigiu com Róger Carlomagno, 24.
O curta já foi exibido em festivais em Brasília, Niterói e Buenos Aires e é uma adaptação do conto homônimo do escritor mineiro Murilo Rubião. "Basicamente, é um triângulo amoroso em que dois homens foram abandonados pela mesma mulher e passam a buscar, um no outro, a lembrança do relacionamento perdido", diz.
"Ardil" é seu segundo filme. Antes, João fez "O Retrato de Deus Quando Jovem", que também participou de festivais. "Procuro fugir da linguagem e da narrativa tradicionais." Ele também faz duras críticas ao atual momento do cinema brasileiro. "A ditadura técnica está tomando conta, quando a matéria-prima principal é a idéia. Walter Salles e o pessoal da Conspiração Filmes se preocupam muito com a estética publicitária e deixam de lado o fundamental", diz.
João também acha lamentável a falta de espaço para o curta-metragem no Brasil. "O festival internacional, um dos poucos existentes, este ano segregou os filmes de escola de forma violentíssima." Ele reclama que os curtas dessa categoria ganharam as piores salas e horários.
Admirador de Glauber Rocha e Woody Allen, Rodrigo Lorenzetti, 23, que se forma este ano pela Escola de Comunicações e Artes da USP, comparece com "Cemitério de Elefantes". "É sobre um ator que vai interpretar um bêbado morador de rua e, para compor o personagem, entra em contato com esse universo", explica. Nas filmagens, rolou até tentativa de agressão. "Não havia preparação das entrevistas, então não havia como prever as reações", conta ele, que ganhou no ano passado um prêmio do Itaú Cultural que ajudou a bancar o filme.
"O cinema nacional precisa mudar. Sou a favor de filmes baratos: quando são caros, acabam engessando o diretor. Falta criatividade e sobra embelezamento."


Veja a programação do festival de curtas no Acontece


Próximo Texto: Veteranos dão dicas a novatos
Índice

Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.