São Paulo, segunda-feira, 24 de março de 2008

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esporte

Judô na luta

A modalidade tem hoje no Brasil 2 milhões de praticantes, mas só 14 vão ter a chance de participar da Olimpíada de Pequim

JULIANA CALDERARI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

"E m qual faixa você está?" Há 20 anos, era bem comum ouvir essa pergunta nos corredores das escolas. Assim como o balé ou o jazz eram obrigatórios para as meninas, na década de 80, o judô era o esporte preferido dos meninos. Embora atualmente o esporte enfrente a concorrência de outras modalidades como o jiu-jítsu, o número de filiados às federações de judô tem aumentado muito nos últimos três anos, e isso se reflete no número de medalhas que o Brasil vem ganhando, explica o coordenador técnico da seleção olímpica brasileira, Ney Wilson. O judô é o terceiro esporte com mais vitórias no país, atrás apenas do iatismo e do atletismo.
Para conseguir superar essa colocação, foi escalado um time de 14 atletas, cuja média de idade é de 24 anos. Deles, apenas Edinanci Silva e Leandro Guilheiro já participaram de Jogos Olímpicos. Para o coordenador técnico, a pouca idade dos judocas pode ser uma vantagem.
"Eles têm mais espontaneidade, versatilidade e amplitude motora. Os atletas já formados já vêm com qualidades, mas trazem também defeitos", diz.
Espontaneidade era o que não faltava para João Gabriel Felizardo, 23, quando, aos seis anos de idade, ganhou a faixa branca. "Eu ia assistir a meu irmão treinar judô e ficava atrapalhando. Invadia o tatame e fazia a maior bagunça. Aí meus pais me matricularam na aula."
João, que tem 1,99 m e 110 kg, vai disputar a categoria de atletas acima dos 100 kg. No início, não gostava de judô. "Eu costumava fugir dos treinos para jogar videogame." Ele acredita que só não abandonou o esporte por ser muito competitivo.
"Gosto muito do contato direto e da conquista. Passei a curtir os treinos depois que entendi que, para competir, era preciso treinar." Para estar na Olimpíada, João treina em média cinco horas por dia.
Familiarizada com a rotina puxada, Danielle Yuri, 24, dorme, come e respira judô. Filha de um professor da arte marcial, ela costuma dizer que nasceu num tatame. "Aos seis, eu já estava competindo", conta.
Danielle treinou com o pai até os 11 anos, quando a família se mudou para o Japão. Lá, deu continuidade no aprendizado durante oito anos, quando resolveu voltar ao Brasil.
A concorrência acirrada no Japão também foi outro fator que a trouxe de volta às terras tupiniquins. "Lutar judô no Japão seria como um japonês entrar na seleção de futebol", diz.
Sem olhar para trás, a descendente de japoneses juntou dinheiro, pôs a mochila nas costas e veio para São Paulo. Hoje mora em uma república do clube São Caetano, junto com outras seis lutadoras. "Quando estão todas com TPM, sai briga", confessa. Mas nada de golpes de judô. Isso, só no tatame, onde recebe conselhos da veterana Edinanci.
Dos desafios que a judoca tem que superar, o mais difícil é adaptar seu estilo clássico à malícia brasileira e à força européia. "Meu judô é bastante japonês. Na Europa eles usam muita força. Se tiverem que quebrar um dedo para finalizar um golpe, elas quebram."
A mais nova representante da modalidade em Pequim, Mayra Aguiar, 16, também teme as moças do Hemisfério Norte. Adepta do "judô brasileiro", ela credita seu sucesso à família. "Meu pai praticava taekwondo; minha mãe, caratê, e minha irmã também faz judô." Com o apoio deles, ela não desistiu. "Às vezes fico cansada e bate um pessimismo."
Assim como os outros, Mayra fez uma série de concessões para chegar ao topo. "Sinto saudade de ir ao shopping e dos amigos do colégio." Mesmo assim, nada abala a recompensa de subir ao pódio. "Fecho os olhos e vejo todo meu trabalho e meu suor", diz a judoca, que, esperamos, deixe Pequim com uma medalha de ouro no pescoço.


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