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O som glacial de uma Nova York que já viu tudo
ÁLVARO PEREIRA JÚNIOR
COLUNISTA DA FOLHA
A batida psicodélica lembra os Beatles do álbum "Revolver", mas a letra é muito mais
sofrida, falando de alguém que já ouviu de tudo, sente pena e não se importa mais: "That's
OK, OK, OK...".
É um som amplo, definido por espaços, esculpido com segurança. Não se trata, é certo,
de uma banda aflita em busca das últimas novidades. Estamos
em terreno sólido,
autodeterminado,
de estetas tomados
de razão. Aqui, o que
se convencionou
chamar de rock and
roll ganha outro nome, de apenas quatro letras: arte.
A canção se chama "Revenge Wears no
Wristwatch", tem gosto de século 21 e combina influências de maneira tão brutalmente explosiva que o melhor adjetivo para defini-la é
mesmo "moderna". O nome da banda é
Walkmen. Ela faz parte da novíssima cena de
Nova York, que tantos olhos atrai hoje em dia.
Mais do que outros contemporâneos/conterrâneos seus, como Strokes e Yeah Yeah
Yeahs, os Walkmen derramaram sangue pelo
labirintos do rock independente, que quase
nunca levam ao sucesso. Três de seus componentes vieram do grupo Jonathan Fire*Eater,
que havia sido escalado, em um contrato milionário com a Dreamworks, como o grande
sucesso "indie" do final dos anos 90. Assim
como havia acontecido anos antes com outro
grupo independente de sólida reputação, o
Girls Against Boys, o fracasso foi avassalador.
Dos escombros do "big business", no entanto, obteve-se algum dinheiro e, com ele, foi
construído um estúdio no Harlem, encomendado em cada detalhe pelos ex-Jonathan Fire*Eater, agora Walkmen.
Resultou em um som metálico, glacial, nascido no exato ponto em que o Joy Division se
transformou em New Order, como já definiu
um crítico americano. No site oficial
(www.marcata.net), os cinco walkmen listam
como suas influências principais: Bruce
Springsteen, Randy Newman, Pogues, Cure,
Bjork, Smiths, Neil Young, John Lennon e,
claro, Joy Division.
A imprensa de língua inglesa se desdobra
para tentar classificar os Walkmen. O próprio
Joy Division, o Radiohead, e até concertos para piano de Chopin já foram evocados. Eu
acrescentaria mais um nome: Mercury Rev.
Referências que atestam a qualidade imponente do que fazem os Walkmen.
"Revenge Wears no Wristwatch", a canção
que motivou este texto, chegou a meu computador via Audiogalaxy, o sistema de troca
de música on-line fuzilado pela associação
das grandes gravadoras americanas na semana passada. Eu estava baixando outras faixas
quando o sistema foi tirado do ar.
Aguardamos com ansiedade a chegada de
alternativas com a mesma eficácia do AG. Assim como um mau negócio com a Dreamworks não derrubou os músicos do Jonathan
Fire*Eater, a sanha das grandes gravadoras
não vai matar a troca de arquivos pela internet. Em ambos os casos, o amor pela música
prevaleceu. Que seja sempre assim.
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