São Paulo, segunda, 28 de abril de 1997.

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Soundgarden foi vencido pelo tédio

ÁLVARO PEREIRA JÚNIOR
especial para a Folha

A notícia veio há duas semanas. Pela Internet, o leitor Christiano Barros, de Belo Horizonte, me avisava do fim do Soundgarden, a banda de Seattle que provou ainda ser possível fazer hard rock com vigor e inteligência.
Foram seis álbuns oficiais entre 1987 e 1996. O sucesso de massa só veio com a balada "Black Hole Sun", de 1994, mas muito antes eles já faziam rock de primeira, sempre mais ou menos à margem da cena grunge capitaneada pelo conterrâneo Nirvana.
O grunge vivia da pegada punk, e simplesmente ninguém acreditaria em uma banda punk que tivesse, como o Soundgarden, a coragem de botar na guitarra o tiozinho hiponga Kim Thayil.
Lembro da primeira vez em que ouvi Soundgarden. Foi em 1989, época de lançamento do disco "Louder Than Love". Liguei o rádio na então venerada WFNX, rádio alternativa de Boston (EUA), onde eu estudava.
Peguei a música na metade e fiquei esperando o final, para saber de que se tratava aquela barulheira toda. Por cima dos últimos acordes da guitarra, veio a voz do locutor fazendo um trocadilho: "This is the garden of sound, and I'm the sound gardener" ("este é o jardim sonoro, e eu sou o jardineiro do som"; em inglês soa mais legal).
Virei fã, acabei perdendo um show deles logo depois (esgotou rápido, na época eles tocavam em clubes pequenos) e só fui ver o Soundgarden ao vivo no festival Lollapalooza de 1992, junto com Lush, Pearl Jam, Jesus and Mary Chain, Ministry e os Chili Peppers (não preciso dizer que foi o melhor Lollapalooza de todos os tempos).
O show deles não chegou a contagiar os jecas da platéia, loucos para acender isqueiros na apresentação melosa dos Chili Peppers. Mas eu adorei.
Como apontou o Christiano na mensagem que recebi, o fim da banda não poderia ser mais melancólico. Ao que tudo indica, eles não brigaram, continuam chegados. Foi tédio mesmo.
O comunicado oficial é um curto tratado de espírito anti-rock and roll. "Depois de 12 anos, os membros do Soundgarden decidiram, amigável e mutuamente, se separar em busca de outros interesses. No momento, não há informações sobre planos para o futuro."
Só isso. Nem mesmo a inevitável desculpa: "diferença artísticas".
Conversando sobre "aquele" assunto (o fim do rock) com um amigo, concluímos o que já escrevi aqui algumas vezes: o rock, hoje um gênero em que grandes bandas acabam pelo bom motivo de não ter mais o que fazer, está condenado, como o jazz, à condição de morto-vivo.
As lojas vão continuar a ter prateleiras de rock. Barrigudos carecas vão seguir apreciando o tipo de música de sua juventude. Vai haver concertos em casas de shows "específicas".
Mas o rock como veículo de inquietação jovem acabou. Igual ao Soundgarden.


Álvaro Pereira Júnior, 34, é editor-chefe do "Fantástico" (Rede Globo)

cd player

`This is a Long Drive for Someone with Nothing to Think About', Modest Mouse
A idade nos faz ficar benevolentes. Em outros tempos, um CD com um título cabeça desses iria direto para o Eject. Mas o Modest Mouse, queridinho das rádios universitárias americanas, ganha o Play porque pelo menos parece Pixies.

`The Normal Years', Built to Spill
Atenção: este não é o álbum do Built to Spill que está arrebentando nas paradas alternativas americanas. "The Normal Years" é de 1996 e foi lançado pelo selo K, o que costuma ser garantia de qualidade. Com uma frase, resume-se o som do Built to Spill e de quase todas as bandas novas americanas: parece Pavement.

`Now, More Charm and More Tender', Pee
A primeira faixa deste CD é só para fazer a gente pensar que acabou a pilha do aparelho de CD. Depois vem um monte de gracinhas, como aparecer no visor que o CD tem 51 faixas. Não dá para aguentar. Eles podiam deixar de ser metidos e parar de imitar o Superchunk.

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