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COMPORTAMENTO
O amor muda
O que acontece
quando um membro
de um casal hétero
descobre ser gay, bi ou
lésbica? Os dois lados
da história contam
CHICO FELITTI
DA REPORTAGEM LOCAL
Sabe o papo de pé na
bunda "o problema
não é você, sou eu?"?
Às vezes, o problema é uma questão de incompatibilidade: um dos membros do
casal hétero descobre que gosta
de pessoas do mesmo sexo.
É comum que essa descoberta role na adolescência, diz o
psicólogo da USP Thiago de Almeida. "É nessa época que se
tem os primeiros relacionamentos profundos, que ajudam
na definição", diz o psicólogo.
Definição foi o que aconteceu
com a fotógrafa Lilian Fiudisaw, 23, aos 14 anos. Ela namorou Vicente, 24, por um ano.
Terminaram "por nada" e
"não fez diferença nenhuma",
porque seguiram como melhores amigos. Só que, menos de
um ano depois, Vicente descobriu que era gay e contou a ela.
"Adorei! Em vez de sair do armário, ele me puxou para dentro", diz ela, que apresentou ao
ex o cara que ele namora agora.
Depois da revelação, Lilian e
Vicente até moraram juntos
-cada um com seu quarto.
A situação de compreensão
como essa é a ideal. Mas não é
constante entre os pacientes do
psicólogo Klecius Borges, especialista em gays. "É rejeição [o
que o parceiro sente]. As respostas a isso são imprevisíveis."
Virna*, 19, por exemplo, acha
que tem "dedo vara de condão",
pois dois de três garotos que
namorou "saíram do armário".
Passou 2007 sendo "mais
mãe do que namorada" de
João*, o primeiro. "Quando nos
beijávamos, faltava paixão. O
abraço dele não tinha aperto, e
ele não fazia questão de... Achei
que fosse porque ele era triste."
O menino se revelou depois
que eles tinham terminado,
porque foi fazer intercâmbio
nos EUA -e escreveu de lá narrando as minúcias da sua "segunda primeira vez".
"Foi uma carta de amor, já
que ele confiou em mim." De
volta ao Brasil, o garoto disse à
Folha que "sem ela, teria sido
mais difícil [se assumir]".
Já o segundo ex-namorado
gay, de 23 anos, largou-a há seis
meses por um cara que ela diz
se parecer muito com ele.
"Eles são tããão gatos juntos",
lamenta-se Virna. Podem ser
atraentes porque ela, inconscientemente, procura por homens gays, diz Klecius Borges.
"Não é que pode ser?", diz ela.
Fábio*, 18, admite que se sentiu bastante atraído pela cena
que sua namorada Liza*, 19, lhe
narrou chorando no ano passado. De porre na festa do teatro,
ela tinha beijado uma menina.
"Pensei que pudesse "sobrar"
algo dessa crise para mim, tipo
um convite." Ledo engano.
Três meses depois da festa, tomou "um pé" da garota.
"Ele me xingou bastante",
conta Liza. Ela diz que Fábio
reagiu assim por achar que era
"onda" ela ficar com meninas.
Ela hoje namora uma moça e
sai, só na amizade, com o ex .
Mas nem sempre a história
termina em carinho. Há casos
em que o amor passa ao ódio.
Tô de mal
Dos 15 aos 18, Léa* amou seu
então namorado Paulo* -que
amava em segredo Juca*, que
era seu melhor amigo. Bom, isso era o que os garotos diziam
em público, até confessarem a
Léa, 19, que namoravam.
"O pior foi não ter sido a primeira a saber. Ele me contou
depois de se assumir para a
mãe!", diz ela, que acha que a
raiva não vai se esvair nunca.
A fúria não vem da traição ter
sido com um homem ("Acontece..."), e sim de "ter servido para
ninguém da turma desconfiar".
É difícil que uma revelação
dessas venha sem o sentimento
de traição, mesmo que não sexual, diz Klecius Borges.
O psicólogo Almeida aconselha quem estiver no lugar de
Léa a não se culpar pelo fim.
Isso implica em não pensar
que a escolha do outro poderia
ter sido evitada, fosse você mais
magro, loura ou malhado.
"Não faltava alguma coisa ao
parceiro largado, e sim a quem
largou, que foi atrás disso e só
quer ser feliz", diz Almeida.
Os dois especialistas recomendam apoio mútuo nessa
hora. "Há mais amor do que
quando namoramos", diz Virna
-João, o ex, gay, confirma.
* Nomes fictícios
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