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DO BAÚ
Cultura racional passa de pai para filho
CLAUDIA ASSEF
da Reportagem Local
Em meados dos anos 70, Tim
Maia colocava na praça dois LPs
para lá de bombásticos, "Tim
Maia Racional", volumes um e
dois.
Além do som absurdo -no
bom sentido- que Tim andava
tirando, o que chamava a atenção
nos discos era a panfletagem do
cantor em favor de sua nova obsessão: a cultura racional -naquela década, uma leva de músicos, atores e anônimos entrou de
cabeça no estudo do livro "Universo em Desencanto", a base de
toda a "fase" racional.
Longe da mídia desde que Tim a
abandonou, a cultura racional
ainda usa a música como forma
de divulgação, especialmente entre os jovens.
No Brasil, a cultura mantém dezenas de grupos de jovens que se
reúnem para estudar o livro "Universo em Desencanto" e para tocar. São as chamadas bandas racionais.
A Banda Racional de São Paulo,
por exemplo, é formada por 233
integrantes, a maioria jovens, que
se apresentam em feriados nacionais, festas folclóricas e, é claro,
convenções da cultura racional.
"Comecei a estudar aos 12
anos", diz Karina Bárbara, 20, integrante da banda, referindo-se à
leitura da "bíblia" dos racionais, o
"Universo em Desencanto".
A obra, composta por 1.006 (!!!)
volumes, foi escrita entre 1935 e
1988 pelo funcionário público
Manoel Jacintho Coelho (1903-1991), a quem os adeptos da cultura referem-se como "mestre" ou
Superior Racional.
Além de usar o termo "estudar"
quando falam sobre a leitura do
"Universo em Desencanto", os seguidores do racional costumam
repetir neologismos encontrados
no livro. Referem-se ao corpo como "aparelho", falam em "divulgar" a cultura e dizem que a vida
no "artifício" (onde há bens materiais) deve ser levada da maneira
mais racional possível.
"Uma prima divulgou (a cultura) para mim. Fiquei ainda mais
encantada quando conheci a banda racional. Achei a coisa mais
linda do mundo. Passei a ler o livro e entrei para a banda", conta
Karina.
Assim como Tim na fase racional, os adolescentes que participam das bandas racionais aproveitam as apresentações para difundir, por meio de músicas e de
seus uniformes, o legado deixado
pelo "mestre" Manoel.
"Comecei a ler o livro aos 11
anos e me conscientizei. Daí entrei para a banda para divulgar a
cultura a outros jovens que estão
precisando", diz o estudante Vitor Colombo, 18, trompetista da
banda.
"Nasci com o livro na mão"
A cultura racional é transmitida
aos mais jovens pelos pais, tios e
primos mais velhos seguidores da
cultura racional.
"Tive o privilégio de nascer com
o livro na mão, digamos assim",
diz a estudante Renata Lípia Lima, 15, também integrante da
banda racional paulistana.
Segundo a mãe da garota, a comerciante Elvira Maria de Lima,
44, a cultura racional nunca foi
imposta aos filhos. "Eles começam a estudar quando se sentem
prontos", garante. Junto com o
marido, Elvira toca uma das livrarias racionais de São Paulo, localizada no centro.
Na livraria, só são vendidos volumes do "Universo em Desencanto", a preços que variam de R$
10 a R$ 21. Lá é possível encontrar
todos os 1.006 volumes da obra.
"Às vezes, pode faltar um ou outro volume", diz Francisco Valdir
Ricardo de Lima, 48, que ganhou
há cinco anos a concessão para
comandar a livraria.
Para participar de eventos e administrar livrarias racionais, o
"estudante" da cultura precisa ter
permissão do Retiro Racional
Universo em Desencanto, a sede
dos racionais, um conjunto de
enormes galpões situado no Rio
de Janeiro.
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