São Paulo, sábado, 30 de março de 2013

Cafuné


Aranhas (parte 2)

CLARICE REICHSTUL
COLUNISTA DA FOLHA

No céu azul da manhã, brilhou um fio. Um fio transparente, quase invisível. Só dava para ver quando batia o sol e, mesmo assim, de um ângulo específico, meio de baixo para cima.
Bernardo estava indo a pé para a escola quando viu aquele brilho engraçado. Ficou curioso, afinal, não é todo dia que a gente vê um fio pendurado no céu, quero dizer, pendurado em alguma coisa ou em algum lugar acima do céu, porque não dava para ver a ponta de cima dele.
Olhou admirado para o tal do fio, tão fino, tão incolor. De onde será que ele vem? Não resistiu e encostou nele. Não é que o fio grudou em seu dedo e não queria soltar de jeito nenhum? Tentou uma, duas, três vezes se desgrudar do tal do fio, mas nada.
Como estava ficando atrasado para a escola, resolveu não dar bola para o dito cujo e seguiu seu caminho. Atravessou a rua na faixa, passou em frente à padaria, à banca de jornais e ao ponto de táxi com o fio grudado em seu dedo, e ninguém percebeu.
Passou pelo portão bem na hora do sinal, foi correndo para a classe e entrou segundos antes de o professor chegar. A manhã transcorreu normalmente: aula chata, aula legal, futebol no intervalo, aula de educação física, cochicho com as meninas no corredor, enfim, tudo igual. Quero dizer, igual, igualzinho, não. Afinal, tinha aquele maldito fio grudado no dedo, o que ninguém achava estranho ou anormal.
De onde será que ele vinha?


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