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PORTUGUÊS
Posição dos termos na frase pode alterar sentido
THAÍS NICOLETI DE CAMARGO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Em outros momentos, já tratei
neste espaço do problema do
arranjo dos termos na frase. Há
casos em que a escolha da posição
da palavra está a serviço do estilo
e produz uma variação de ênfase,
mas, em outros, o que se percebe é
a alteração do sentido pretendido.
Observe o trecho a seguir, extraído de notícia relacionada ao
acidente na base de lançamentos
de Alcântara: "Bevilacqua concedia uma entrevista sobre o acordo
firmado entre Brasil e Ucrânia
justamente para o uso da base de
Alcântara na hora do acidente".
Na verdade, a intenção do redator era dizer que Bevilacqua concedia a entrevista exatamente na
hora do acidente. Houve uma
coincidência entre a hora da entrevista e a hora do acidente. Do
modo como escreveu, entende-se
que o acordo firmado entre o
Brasil e a Ucrânia visava ao "uso
da base de Alcântara na hora do
acidente" (somente nessa hora).
Como tem valor restritivo, o advérbio "justamente" limita o sentido da seqüência que lhe sucede.
A sua posição na frase, portanto,
é pertinente à produção do significado. O ideal seria que tivesse
dito: "Bevilacqua concedia uma
entrevista sobre o acordo firmado
entre o Brasil e a Ucrânia para o
uso da base de Alcântara justamente na hora do acidente".
Situação semelhante ocorre
com a palavra "só", denotativa de
exclusão, de acordo com a Nomenclatura Gramatical Brasileira.
Num período como "Ela só lê
poesias", entende-se, por exemplo, que ela não escreve poesias. A
palavra "só" limita a que lhe sucede, ou seja, a forma verbal "lê" (só
lê, não escreve). Caso se dissesse
"Ela lê só poesias", entender-se-ia
que ela não lê outro tipo de texto.
Na linguagem falada, as pessoas,
muitas vezes, não sentem a necessidade de colocar a palavra restritiva no lugar exato porque se valem de uma entonação capaz de
explicitar o sentido desejado.
Na linguagem escrita, porém,
inexiste a possibilidade de assinalar a entonação num caso como
esse. Daí a importância de buscar
a expressão precisa, que não dê
margem a uma segunda leitura,
ainda que a validade desta seja
improvável no contexto, como se
dá no exemplo usado na abertura
desta coluna.
Igualmente, muitos dos casos
de ambigüidade não são percebidos na fala, mas apenas na escrita.
Thaís Nicoleti de Camargo é consultora de língua portuguesa da
Folha.
E-mail: tnicoleti@folhasp.com.br
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