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      São Paulo, quinta-feira, 28 de agosto de 2003
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PORTUGUÊS

Posição dos termos na frase pode alterar sentido

THAÍS NICOLETI DE CAMARGO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Em outros momentos, já tratei neste espaço do problema do arranjo dos termos na frase. Há casos em que a escolha da posição da palavra está a serviço do estilo e produz uma variação de ênfase, mas, em outros, o que se percebe é a alteração do sentido pretendido.
Observe o trecho a seguir, extraído de notícia relacionada ao acidente na base de lançamentos de Alcântara: "Bevilacqua concedia uma entrevista sobre o acordo firmado entre Brasil e Ucrânia justamente para o uso da base de Alcântara na hora do acidente".
Na verdade, a intenção do redator era dizer que Bevilacqua concedia a entrevista exatamente na hora do acidente. Houve uma coincidência entre a hora da entrevista e a hora do acidente. Do modo como escreveu, entende-se que o acordo firmado entre o Brasil e a Ucrânia visava ao "uso da base de Alcântara na hora do acidente" (somente nessa hora).
Como tem valor restritivo, o advérbio "justamente" limita o sentido da seqüência que lhe sucede. A sua posição na frase, portanto, é pertinente à produção do significado. O ideal seria que tivesse dito: "Bevilacqua concedia uma entrevista sobre o acordo firmado entre o Brasil e a Ucrânia para o uso da base de Alcântara justamente na hora do acidente".
Situação semelhante ocorre com a palavra "só", denotativa de exclusão, de acordo com a Nomenclatura Gramatical Brasileira.
Num período como "Ela só lê poesias", entende-se, por exemplo, que ela não escreve poesias. A palavra "só" limita a que lhe sucede, ou seja, a forma verbal "lê" (só lê, não escreve). Caso se dissesse "Ela lê só poesias", entender-se-ia que ela não lê outro tipo de texto. Na linguagem falada, as pessoas, muitas vezes, não sentem a necessidade de colocar a palavra restritiva no lugar exato porque se valem de uma entonação capaz de explicitar o sentido desejado.
Na linguagem escrita, porém, inexiste a possibilidade de assinalar a entonação num caso como esse. Daí a importância de buscar a expressão precisa, que não dê margem a uma segunda leitura, ainda que a validade desta seja improvável no contexto, como se dá no exemplo usado na abertura desta coluna.
Igualmente, muitos dos casos de ambigüidade não são percebidos na fala, mas apenas na escrita.


Thaís Nicoleti de Camargo é consultora de língua portuguesa da Folha. E-mail: tnicoleti@folhasp.com.br


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