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Ficção une devaneios de gênios da matemática
Romance de cientista traduz em prosa ideias de Alan Turing e de Kurt Gödel
Autora delineia conflito de ideias que geraram debates sobre os limites da lógica
e o futuro da inteligência artificial de computadores
RAFAEL GARCIA
DA REPORTAGEM LOCAL
Não é preciso muito esforço
para transformar as vidas dos
matemáticos Alan Turing e
Kurt Gödel em literatura. Com
suas histórias atribuladas e
suas mentalidades obsessivas,
ambos já foram objeto de biografias convencionais que ganharam ares de drama teatral.
Um livro que trata de conexões
impensadas entre as ideias de
ambos, porém, dá agora uma
dimensão a mais para o trabalho dos dois pensadores, já reconhecidos como gênios.
"Um Louco Sonha a Máquina
Universal", romance histórico
de Janna Levin, constrói um
edifício imaginário sobre as
elucubrações dos dois matemáticos, que viveram na primeira
metade do século 20 mas nunca se encontraram (leia texto à
dir.). Cosmóloga da Universidade Columbia, de Nova York,
Levin talvez tenha encontrado
uma forma de traduzir em literatura o âmago das ideias matemáticas de ambos.
Mesmo quem é leigo suspeita
que isso não seja tarefa fácil,
mesmo para alguém acostumado a lidar com equações sobre
buracos negros e sistemas caóticos. Com sua maneira de interligar os trabalhos de Turing
e Gödel, porém, Levin conduz o
leitor a uma visão de como duas
descobertas no plano da matemática podem ter implicações
importantes para a compreensão da mente humana.
Turing, que é tido por muitos
pesquisadores como o primeiro
cientista a conceber a idéia formal de um computador, também foi o primeiro a imaginar
como uma modalidade de inteligência artificial poderia tomar forma. Fundamentado em
princípios filosóficos materialistas, postulou que nada em
princípio impediria a criação
de um cérebro tão hábil e criativo quanto o humano, mas com
circuitos mecânicos ou eletrônicos no lugar de neurônios.
Hoje, robôs ainda estão a a
anos-luz de reproduzir a complexidade da mente humana,
mas isso não significa que Turing estivesse errado por princípio, argumenta Levin, ao
transformar em literatura os
pensamentos que ela imagina
terem sido os do matemático
quando concebeu suas ideias.
Se a mente for redutível a
uma máquina, por fim, aquilo
que acreditamos fazer por livre
arbítrio não passaria mesmo de
impulsos programados.
Gödel se contrapõe a Turing,
segundo Levin, por ter oferecido uma prova rigorosa de que a
lógica -um sistema formal de
pensamento- é incapaz de
prever a matemática -esta,
fruto da criatividade humana
para interligar informações.
Levin confabula como a mentalidade obsessiva paranoica de
Gödel pode ter contribuído para a formulação de seus teoremas, mas deixa em aberto a
conclusão sobre o conflito de
ideias a que eles levaram.
UM LOUCO SONHA A MÁQUINA
UNIVERSAL
Autor: Janna Levin
Tradução: Ivo Korytowski
Editora: Companhia das Letras
Quanto: R$ 44 (224 págs.)
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