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NOITE ILUSTRADA - EDIÇÃO ESPECIAL
Eu dancei sobre o Monumento às Bandeiras, em pleno Ibirapuera
ISSO mesmo. Eu fui uma daquelas pessoas que subiram no Monumento às Bandeiras, o famoso deixa-que-eu-puxo do Brecheret, coração do parque Ibirapuera. Foi
sábado, durante a Parada da Paz,
quando mais de 15 mil pessoas (segundo organizadores) participaram da maior celebração da cultura club já vista na cidade.
FOI assim: a "danceata" percorreu seis quarteirões da avenida
Brasil, partindo da rua Colômbia,
até chegar ao Obelisco. Ao fazer a
volta em torno daquela praça, seguindo pelo chão os trios elétricos,
demos ali, de cara com aquela estátua linda. Qual a idéia mais óbvia? Subir, ué. Pois foi o que fizeram dezenas de pessoas, no momento mais emocionante do evento, tanto para quem subiu quanto
para quem viu. Afinal, a vista de
São Paulo assim, com o esguicho
do parque, a silhueta da Paulista e
os carros à sua volta, cheios de
gente sorrindo e dançando, com a
música se confundindo em seus
ouvidos... não é dessas coisas que
se esquece fácil. Ah, e ainda tinha
um balão, que subiu exatamente
nessa hora.
AGORA sim, todos os clãs, reunidos e misturados, sem carão, como há muito a gente não via. Anônimos, tops, clubbers-favela (graças a Deus eles existem), DJs de todos os ritmos, drags as mais bagaceiras e as mais luxuosas. E, já que
a parada era organizada junto com
a campanha pelo desarmamento,
tinha gente fazendo o símbolo da
pomba voando, mas eu não vi um
estudante ali: vi só clubber!
COMO na parada do ano passado
(um filhote perto dessa), houve
quem subisse nos muros e cabines
telefônicas, improvisando palquinhos e esperando a passagem dos
carros, dançando e se comunicando com quem estava lá no alto.
Tinha crianças como Lucca Leuzzi
(em seu melhor modelo robin-clubber, de cabelo verde espetado), o filho de Claudia Liz e Angelo; convidados ilustres como
Edson Cordeiro, Luiz Salem e
Marcia Cabrita; cariocas como
Gringo Cardia; engajados como
Ruth Slinger e Jorjão Espírito Santo (com sua sensacional camiseta
escrito 100% negro); Heitor Werneck vestido de anjo cyberpunk;
os Habitants; Flavinha Ceccato de
pós-pocahontas freak; Veruschka
de neo-pocahontas Goa; Robert
Estevão de clubber W< a ala
fashion representada por Tufi
Duek, Giovanni Frasson, Cesar
Fassina, Patricia Carta, Marcelo
Sebá, André Lima (de Anne Demeulemeester; holy) e Estela Alcântara... Tantos, tantos.
E deu pra sentir a falta do CJ Bolland, porque os DJs nem tiveram a
idéia de tocar muitas músicas famosas. Tem que tocar hit, tem que
tocar as músicas que a gente conhece e gosta; não tem que mostrar "conceito" nem "mostrar o
trabalho". Tanto que quando tocava um hit a gente quase morria
lá embaixo. Quem sabe no ano que
vem. E na progressão supergeométrica de público que tivemos de
97 pra 98, logo chegaremos ao 1
milhão de pessoas que foi à Love
Parade de Berlim.
E faltou dizer que uma pomba
branca iluminou o céu do Ibirapuera, para delírio do povo do gramado. Parece piegas, mas na hora
foi tudo!
OUTRO grande momento clubber
foi Léia Bastos, rainha trash de todas as noites, sobre o carro, dançando, iluminada, com sua peruca
de Marilyn e saia de plumas coloridas. E o que era ela segurando a
Normanda, chapeleira do Hell's e
de todos, de pé quebrado, gesso e
tudo? E, ao final, que lindo, Léia
foi se despindo e dando os boás
para o povo, terminando numa
imagem andrógina e absoluta. Léia
é o verdadeiro espírito da cena.
As pessoas se espalharam depois,
em dezenas de chill-ins pela cidade, seguindo depois para as festas.
E a grama, a grama! A parada acabou logo. Saiu às 17h e lá pelas
19h30 já estava estacionada, junto
ao parque. Parece que a CET não
deu conta de que realmente o miolo dos Jardins e da Nove de Julho
parou, com congestionamentos de
6 km. Ah, tudo bem. Era só naquele dia, vai. E aí os carros tiveram
que andar rápido. Olhar a avenida
cheia, do alto, era a sensação de estar numa escola de samba: aquele
mar de gente, lá pra trás.
MAS a grama. Quando os carros
pararam, cada um procurava o
som que mais lhe agradava. Alguém teve, por exemplo, a infeliz
idéia de tocar "Vogue", da Madonna. "Vogue", aqui, não!
E todo mundo saiu correndo para
o carro da B.A.S.E, que vivia ali
seus melhores momentos. Bem ali
na frente tinha um grande gramado. E ali se fez uma pista e ao mesmo tempo uma grande área de
chill-out. E parecia um Woodstock clubber, com um monte de
gente esparramada, derretendo,
encostadas umas nas outras. E devia ter uma placa: cuidado, buracos na pista. Porque teve uma bicha amiga que até caiu num deles.
E a revista "Jockey Slut", inglesa,
pergunta na capa se a grama é o
novo clube, diante dos megafestivais de dance music, Creeamfields
e Universe, que eles vão ter por lá.
Aqui não é a Inglaterra, mas nós
também temos grama!
O pensamento do fim-de-semana
(uma verdadeira maratona clubber), que começou na noite de sexta-feira e foi acabar só no domingo, foi resumido pelo DJ Mau Mau
em seu segundo set no Hell's, às
10h, quando abriu com as palavras
mágicas de Paris Grey no Reese
Project: "We are a family united
together, we are one". E emendou
com os adoráveis vocais de "Direct Me", tendo por trás todo o
fundamento de Kevin Saunderson, um dos criadores do que hoje
entendemos por tecno.
DESCULPE qualquer coisa, desculpe se esta edição é uma coluna
monotemática e quase redundante
(não é todo dia que se faz uma pista de 15 mil pessoas no país). Estamos em momento de integração e
expansão. A dance music é hoje
um idioma falado pela juventude
de todo o mundo, muito além dos
guetos dos clubes, das raves, do
underground ou da cena gay.
PORTANTO, clubbers e ravers de
Brasília, Rio, Campo Grande e São
Paulo, se joguem. Estamos conectados também via Internet, com
mensagens de Londres, Nova
York, Paris e Miami que chegam
sem parar. We are one.
e-mail: palomino@uol.com.br
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