São Paulo, sexta, 1 de maio de 1998

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"O Senhor Paul' opta pelo existencial

VALMIR SANTOS
especial para a Folha

Na versão definitiva de "O Senhor Paul" (Herr Paul, ein Stück), apresentada em 94, cinco anos depois da queda do Muro de Berlim, Tankred Dorst criava mais uma das suas parábolas niilistas sobre a junção de mundos tão opostos: Alemanha Ocidental e Alemanha Oriental.
A montagem da Companhia de Arte Degenerada, que estréia hoje no Instituto Goethe, carrega mais na tinta existencial do que propriamente política do texto.
O diretor Sérgio Ferrara, 30, optou pela descontextualização histórica. Na sua opinião, o processo de unificação alemã não foi assimilado com intensidade no Brasil. Daí o investimento na "coerência interna" dos personagens criados por Dorst, um dos maiores dramaturgos vivos da Alemanha.
"A gente preferiu esse diálogo existencial, essa alma dilacerada que recompõe para o indivíduo o novo e o velho", sustenta Ferrara.
A peça mostra o embate entre Paul (Luiz Damasceno), antigo morador de uma fábrica de sabão em ruínas, e Helm (Marco Antonio Pâmio), jovem capitalista até a medula. Paul recebe ultimato para abandonar a fábrica. Helm, o dono, pretende despejar o inquilino para fazer reformas, ampliar seu lucro. "Ele quer o negócio, mas capitula nas mãos do sr. Paul, que é bastante maquiavélico", explica Damasceno, 57.
Ele define seu personagem como "quase um Beckett", transitando na superficialidade cotidiana. "A única esperança dele é acabar o dia com tranquilidade e dormir."
Duas figuras femininas também ganham voz no texto: Luize (Beatriz Tragtenberg) é a irmã de Paul, enquanto Lilo (Iara Jamra) é a namorada do carreirista Helm.
Esta última surge como única válvula de humor no universo sem utopias refletido por Dorst. Para quem já vestiu o uniforme da impagável Olimpia em "Trair e Coçar, É Só Começar", Iara Jamra, 42, se dá por satisfeita com sua enfermeira de voz estridente e algo patética. "Lilo é a namoradinha ideal, que deve transar bem com Helm, é meio louquinha, mas não tem nada de submissa", garante.
Com o texto de Dorst, a Arte Degenerada dá sequência à pesquisa da dramaturgia alemã iniciada com "Lulu" (96), de Frank Wedekind. Em 97, a companhia recebeu um ilustre visitante: Paulo Autran atuou em "Antígona".
A experiência de dirigir Autran, 75, deu subsídios para Ferrara usar em "O Senhor Paul". Com a ressalva de que não houve confronto, mas troca. "Vejo-me muito como o jovem que precisa falar de si para estabelecer uma relação, mas sem passar por cima dos outros", afirma o diretor mineiro.

Peça: O Senhor Paul Autor: Tankred Dorst (colaboração de Ursula Ehler) Direção: Sérgio Ferrara Com: Companhia de Arte Degenerada Onde: Instituto Goethe (r. Lisboa, 974, Pinheiros, tel. 011/ 280-4288) Quando: estréia hoje, às 21h; sex. e sáb., às 21h; dom., às 18h e 20h Quanto: R$ 10


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