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CINEMA/"O HOMEM DAS NOVIDADES"
Keaton se reafirma como o maior cômico
INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA
Desde os anos 60, quando
Buster Keaton foi redescoberto, a dúvida percorre os cinéfilos do mundo inteiro. Quem foi o
maior cômico de todos os tempos: Keaton ou Charles Chaplin?
A resposta, com freqüência, é
Keaton. Pesa nisso o "fator redescoberta": Chaplin foi saudado como o primeiro (e na época único)
gênio do cinema, aquele que estava acima das taras de uma arte
menor. De certa forma, todos nos
cansamos de incensá-lo. Keaton
era uma alternativa viável, com a
vantagem de fazer o cinéfilo se
sentir um privilegiado, um tanto
superior ao vulgo que admirava
Carlitos incondicionalmente.
"O Homem das Novidades",
que hoje volta ao cartaz em São
Paulo, tende a fazer a balança pesar para o lado de Keaton. Ele foi
um comediante exemplar, mas,
mais do que isso, foi um grande
cineasta. Podemos imaginar as
"gags" de Carlitos no teatro. As de
Buster Keaton, não. Ao contrário
de Chaplin, Keaton não ocupava
o centro da cena. Em seus filmes,
o espaço cinematográfico é essencial para o efeito, tanto quanto o
próprio ator. Nesse sentido, e com
a ajuda do competentíssimo Edward Sedgwick, Buster Keaton é
realmente incomparavelmente
superior a Chaplin. Foi alguém
que compreendeu profundamente o cinema e um dos maiores diretores do período mudo.
A história que se conta não tem,
de modo nenhum, a dimensão
que tinham os filmes de Chaplin.
Aqui vemos um candidato a cameraman que se apaixona pela
secretária de uma firma de cinejornais e cuja especialidade parece ser a de quebrar o vidro do escritório com seu aparelho.
Não é muito -nem é preciso
tomar Charles Chaplin como parâmetro. No entanto, à medida
que o filme se desenvolve, nosso
cameraman vai entrando, com
seu jeito impassível, numa espécie
de espiral delirante de eventos
que o tomam de assalto.
Keaton não é um desastrado. É
alguém que procura controlar da
maneira mais racional possível
um mundo que insiste em escapar ao seu desejo de controle.
Como todo cômico, ele faz suas
trapalhadas, mas essa não é a essência de seu estar no mundo, e,
sim, a aplicação incomum naquilo que faz. Trata-se, no mais, de
um personagem melancólico,
metódico, obstinado. A obstinação é que faz "O Homem das Novidades" ser o que é, pois sem ela
seria inconcebível alguém se expor aos riscos que Buster Keaton
corre, por exemplo, na seqüência
do bairro chinês.
Keaton ainda deve ser, para
muitos, uma novidade. Melhor:
esse homem de rosto melancólico, que não parece disposto a
acreditar na inocência do mundo
para fazer humor, terá para essas
pessoas o gosto das grandes e insubstituíveis descobertas.
O Homem das Novidades
The Cameraman
Direção: Edward Sedgwick
Produção: EUA, 1928
Com: Buster Keaton, Marceline Day, Harold Goodwin
Quando: a partir de hoje no Espaço Unibanco e no Frei Caneca Unibanco
Arteplex
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