São Paulo, quarta-feira, 01 de setembro de 2004

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LITERATURA

Escritor cria universidade imaginária e faz mural da vida nos EUA

Tom Wolfe retoma velhos fantasmas

DIEGO A. MANRIQUE
DO "EL PAÍS"

Com a habitual falsa modéstia, Tom Wolfe garante que está melhorando seu estilo como romancista. Depois do impacto de "A Fogueira das Vaidades", ele demorou 11 anos para completar "Um Homem por Inteiro"; "I Am Charlotte Simmons" [Sou Charlotte Simmons] lhe custou seis anos de trabalho.
Boa parte do período foi dedicada a uma imersão na vida estudantil, para elaborar a consciência da fictícia Universidade Dupont, o cenário de seu novo livro. Wolfe conta que conseguiu se fazer invisível, depois de algumas semanas. "Para mim, passar incógnito queria dizer não usar um terno branco. Chegou um momento em que os universitários aceitaram que era bastante improvável que, com as minhas roupas amarfanhadas, eu fosse um policial a paisana."
Como já se tornou tradição, a revista "Rolling Stone" publicou o primeiro fragmento de "I Am Charlotte Simmons" em seu número de agosto. A revista de Jann Wenner está associada a Wolfe desde o início de sua carreira. Foi lá que saíram, em 1973, as primeiras reportagens sobre as vidas de pilotos e astronautas que ele converteria no livro "Os Eleitos".
"I Am Charlotte Simmons" oferece um grande mural da vida norte-americana, do confronto entre as pessoas honestas e os poderosos. A protagonista é uma estudante disposta a aproveitar ao máximo as suas oportunidades: à primeira vista, a Universidade Dupont é um paraíso se comparada a Sparta, a cidadezinha da Carolina do Norte onde ela vivia. Mas Dupont não é a Atenas de seus sonhos: a maioria de seus colegas, acostumados aos privilégios e protegidos por escudos invisíveis, não têm outro objetivo que não desfrutar dos anos de faculdade com muito sexo e bebedeiras épicas.
O segundo personagem central é Hoyt Thorpe, um mau caráter, filho de um tubarão das finanças que fugiu dos Estados Unidos depois do colapso de sua pirâmide de investimento. A reputação de Thorpe entre os alunos cresce quando ele descobre um político em momento comprometedor e deixa seu guarda-costas fora de combate.
Como era de esperar em um romance de Wolfe, seus velhos fantasmas são alvo de muitas estocadas. A universidade tem um círculos de jovens intelectuais, imbuídos de uma suposta superioridade moral. Os estudantes negros não se beneficiam da experiência educativa: estão lá para manter o prestígio da equipe de basquete. Wolfe manteve sua capacidade de observar o detalhe crucial: a biblioteca vitoriana da fraternidade estudantil não abriga livro algum. No lugar deles há latas de cerveja, caixas de pizza e um televisor perpetuamente conectado a um canal de esportes.
De acordo com o pioneiro do "new journalism" nos frenéticos anos 60, as experiências com substâncias psicodélicas abriram caminho ao império dos jogos eletrônicos e da internet.
Para surpresa de Wolfe, as primeiras críticas a "I Am Charlotte Simmons" não vieram do mundo acadêmico, embora seja muito fácil identificar a Universidade Dupont como a Universidade Duke, onde Alexandra, filha do escritor, estudou. Pelo contrário: a tormenta que se vem formando está relacionada à linguagem chula e a certos episódios sexuais: uma importante publicação está negociando publicar alguns capítulos do romance caso Wolfe aceite a censura de determinados termos.
O livro sai nos Estados Unidos no final do ano e na Europa no começo de 2005.


Tradução de Paulo Migliacci

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