São Paulo, segunda-feira, 01 de outubro de 2001

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"O PEQUENO MUNDO"/"A LINHA DO TEMPO"

Jorge Molder abre portas para o vazio

EDER CHIODETTO
EDITOR-ADJUNTO DE FOTOGRAFIA

O corpo como espaço de reclusão e supressão dos arroubos da alma. É esse estado de agonia terminal que o artista português Jorge Molder exibe em duas mostras em cartaz na cidade.
Em "O Pequeno Mundo", 20 fotos em preto-e-branco relatam a aflição emudecida de um homem, representado pelo próprio Molder, que circula no espaço de um velho escritório. Esquadrias, portas e paredes parecem oprimir o ser desorientado que tenta esboçar algo com lápis e papel.
Mas o quê? Talvez uma saída. Algo que o projete para fora daquela prisão. Mas tudo que o homem consegue desenhar é mais uma porta, tal qual as que o circundam. Mais uma porta que se abre para dentro. Corredores e portas, no caso de Molder, não significam entrada e saída, mas a manutenção do labirinto.
É de forma mordaz que Molder tece a metáfora do dilema do homem moderno. O velho escritório, o "Pequeno Mundo", não é, senão, a reverberação do homem que se bate dentro do próprio corpo, tentando encontrar caminhos que o conduzam à razão perdida.
Se romper estados de ânimo que nos aprisionam é condição básica para o bom viver, Molder aponta, cruelmente, para a falência dessa possibilidade. Embora o homem procure saídas, é notória sua apatia, sua falta de impulsividade em romper com as amarras que ele próprio se coloca.
Não se trata mais do dilema de Kafka diante da porta do castelo. Molder avança pela porta. Estão todas escancaradas diante dele e, no entanto, tudo que ele encontra é o espaço vazio e bloqueado. Há muitas saídas e nenhuma entrada.
O personagem Molder vaga em busca de algo que se quebrou, de um fio narrativo perdido na "Linha do Tempo". Não há marcas de histórias vividas nem a possibilidade de projetar história futura.
Essa desesperança exacerbada finda por deixar o trabalho um tanto incômodo e antipático aos olhos do observador. Não é um trabalho feito para o deleite. É quase feio. Mas muito bom.


O Pequeno Mundo
    Onde: Marília Razuk Galeria de Arte (av. 9 de Julho, 5.719, São Paulo, tel. 0/xx/ 11/3079-0853)
Quando: de seg. a sex., das 10h30 às 19h, sáb., das 11h às 14h; até 27/10
Quanto: entrada franca; obras de US$ 3.000 a US$ 6.000
A Linha do Tempo
   
Onde: Gabinete de Arte Raquel Arnaud (r. Arthur de Azevedo, 401, São Paulo, tel. 0/xx/11/3083-6322)
Quando: de seg. à sex., das 10h às 19h, sáb., das 11h às 14h; até 27/10
Quanto: entrada franca; obras de US$ 3.000 a US$ 6.000



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