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DISCO/CRÍTICA
Atordoada, artista opta pela variedade por indecisão
DA REPORTAGEM LOCAL
No xadrez das reviravoltas
de mercado e do esgotamento da música baiana ultracomercial, a crise visitou Daniela Mercury. Isso fica evidente no deslocamento de registro que ela vive,
da mulher que bradava "a cor
dessa cidade sou eu/ o canto dessa
cidade é meu" para a que proclama, na canção de Lenine e Dudu
Falcão que dá título ao novo álbum: "Sou de qualquer lugar".
Se o Brasil vive momento ímpar
de quebra de hegemonias musicais, é inevitável que artistas-símbolo de períodos de hegemonia
(como foram os anos 90 de Daniela e seus pares) fiquem atordoados. "Sou de Qualquer Lugar"
é um disco atordoado, e isso se
traduz particularmente na profusão e variedade de produtores
convocados para concretizá-lo.
É a aposta múltipla que explica,
por exemplo, algum romantismo
fora de foco, como na releitura indecisa de "Mutante". Ou a estranheza de uma adesão ligeira ao
xote universitário em "Quem Puder Ser Bom que Seja", de Gil (em
que ela parece mais Elba Ramalho
do que Daniela Mercury). Ou até
a suspensão, no final do processo,
de uma faixa pop de Lulu Santos
que ela cantaria em duo com Fernanda Abreu.
Mas é o que explica, também, a
singeleza tocante (e algo árabe) de
"Aeromoça", que Daniela compôs com seu filho de 16 anos, e de
"Nina", também de sua autoria.
Ou a regravação dissonante, porém sincera de "A Praieira", um
dos hinos do mangue beat.
Entre prós e contras, Daniela se
expõe como uma artista hoje indecisa, ainda que se esforce sempre por demonstrar rígida decisão. Indecisão não é problema,
propriamente. É o que aparece de
saudável e de humano em sua difícil tarefa de se recolocar no seio
nem sempre nobre da MPB.
Mais fora de lugar nesse mesmo
processo é a metralhadora giratória apontada para mil alvos musicais -a ansiedade em se provar a
um tempo comercial e conceitual,
um cálculo obsessivo.
Tente-se visualizar, nessa hora,
a figura da cantora de barzinho,
moça que se sujeitou aos humores
dos outros para se impor e, talvez
por isso mesmo, engrossou o vozeirão e saiu dali diretamente para
o topo heróico do trio elétrico.
O que ela parece não ter testado,
ainda, é produzir um disco, um
show ou uma vida que atendesse
só e exclusivamente a seus próprios desejos e gostos íntimos.
Talvez não vendesse muito, mas
nada mesmo se tem vendido facilmente no Brasil hoje...
(PEDRO ALEXANDRE SANCHES)
Sou de Qualquer Lugar
Artista: Daniela Mercury
Lançamento: BMG
Quanto: R$ 25, em média
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