São Paulo, segunda-feira, 01 de outubro de 2007

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Soda Stereo lota estádios depois de uma década

"Titãs da Argentina", que mistura punk e pop, volta em turnê a partir do dia 19

Veteranos criaram grupo por influência do Police e dão cara à recuperação da cena musical portenha após a grave crise de 2001

SYLVIA COLOMBO
DA REPORTAGEM LOCAL

Há uma verdadeira "movida" roqueira acontecendo na Argentina, e o capítulo mais importante dessa história acontecerá no dia 19 de outubro, quando os veteranos da banda Soda Stereo subirão ao palco pela primeira vez após uma década de separação.
Os primeiros três concertos, já superlotados, acontecerão no estádio Monumental, do River Plate. A partir daí, o grupo segue em turnê por várias capitais latino-americanas, como Cidade do México, Bogotá, Caracas, Santiago, Quito e Panamá, até encerrar a jornada em Los Angeles (EUA). O Brasil, por ora, permanece fora da rota (mais informações em www.sodastereo.com).
Diferentemente do cinema, que não só reagiu à grave crise argentina de 2001 prontamente como fez dela o principal tema de seus enredos, o rock do país vizinho andava meio paradão. Demasiado tributário de um punk afetado e com exagerada "pose antiianque", a cena local não conseguia fugir a essa caricatura e passou anos morta, apenas pontuada aqui e ali por lançamentos do já passadões Fito Paez e Charly Garcia.
Desde a saída de bandas como Fabulosos Cadillacs (que romperam em 2002) e o próprio Soda (em 1997), nada muito interessante veio à tona. Os últimos três anos, porém, têm sido mais profícuos. Em 2004, tentando mostrar que o país estava, sim, dando a volta por cima das dificuldades, o grupo Bersuit Vergarabat lançou o debochado "La Argentinidad al Palo", e veteranos como Andrés Calamaro e Vicentico voltaram a gravar CDs inspirados ("El Palacio de las Flores" e "Los Pájaros", respectivamente). Anunciada em junho, a volta do Soda virou febre nacional, e o assunto tem concorrido com o noticiário sobre as eleições presidenciais, marcadas para o dia 28 de outubro.

The Police latino
O Soda surgiu no começo dos anos 80, quando um trio de amigos resolveu imitar a formação e o estilo do Police. O vocalista Gustavo Cerati, o baixista Zeta Bosio e o baterista Charly Alberti não demoraram muito para trocar os palcos alternativos de Buenos Aires por shows em grandes estádios.
Entre as apresentações históricas, estão a participação no concerto "Tres Dias por la Democracia", em 1988, que levou 150 mil pessoas à avenida 9 de Julio, e a noite de 1999 em que tocaram com o Tears for Fears, num lotado estádio Velez Sarsfield. A despedida, em setembro de 1997, ocorreu no mesmo Monumental que verá agora a volta dos músicos.
Seu som sempre foi resultado de uma mistura de influências retrô, bandas do pós-punk britânico, ska e tecladinhos setentistas. O resultado fazia lembrar, ao mesmo tempo e de modo inusitado, tanto o Joy Division como o nosso Metrô. No Brasil, ficaram conhecidos como "os Titãs da Argentina".
"Eles faziam uma new wave meio estranha, um pouco pop, um pouco punk. Mas muito legal. Pena que o idioma atrapalhe tanto o sucesso de bandas como o Soda no Brasil", diz o jornalista Fabio Massari.
O intercâmbio entre o rock brasileiro e o argentino, nos anos 80, parecia muito mais promissor do que hoje. Além da explosão do Paralamas do Sucesso por lá, houve alguma troca criativa, de canções e fórmulas. O Capital Inicial fez uma versão de "De Musica Ligera", que virou "À Sua Maneira" (do álbum "Rosas e Vinho Tinto").
"Era uma banda muito bacana, fico feliz que estejam voltando, mas não sou otimista quanto à possibilidade de emplacarem por aqui", diz Dinho, vocalista do Capital. "O rock é algo reto. Só faz sucesso em outros idiomas quando carrega algum elemento de nacionalidade, como o Paralamas. Quem faz só rock, na sua língua natal, tende a não sair desse espaço." Paulo Ricardo, do RPM, concorda. "Quis conhecer as bandas latinas na época do RPM, fui atrás das pessoas, viajei, comprei discos. Era bacana saber que existia essa cena. Mas o rock é algo puramente anglo-saxão. Não dá pra pensar em ir além da barreira da língua se quiser fazer apenas rock."

Ingressos esgotados
O Soda faria inicialmente apenas três shows em Buenos Aires (19, 20 e 21), antes de seguir estrada. Mas os ingressos da turnê "Me Verás Volver" esgotaram em tempo recorde, e duas novas datas na capital argentina foram marcadas, para 3 e 4 de novembro. "Sempre gostei da idéia de que meus filhos pudessem alguma vez ver o Soda Stereo. Eu tinha dito que não íamos nos reunir quando estivéssemos patéticos demais.
Acho que ainda não estamos, por isso decidimos fazê-lo agora", disse Cerati em entrevista.
O vocalista, que depois do fim do Soda partiu para uma carreira solo de sucesso, deixou claro que, depois da turnê, o grupo volta a se separar. "Não planejamos fazer algo novo.
Nem sequer temos tempo para isso e não é a pauta pela qual nós juntamos", acrescentou.
Talvez por ter ficado muito mais conhecido pelas experimentações como solista, Cerati se mostre tão certo quanto a essa decisão. O cantor ainda vive na onda do êxito de "Ahí Vamos" (2006) e tem participado do trabalho de outros artistas.
"Cerati melhorou muito como artista nos últimos anos. O retorno do Soda é uma notícia incrível, mas é preciso lembrar que grande artista ele se tornou após o fim da banda", disse o produtor Gustavo Santaolalla, que convidou Cerati para o mais recente CD do Bajofondo, onde canta "El Mareo".


Colaborou RODRIGO RÖTZSCH , de Buenos Aires


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