Documentário de Amir Labaki traça bom perfil do diretor

LEONARDO CRUZ
DA REPORTAGEM LOCAL

A certa altura de "27 Cenas Sobre Jorgen Leth", o personagem do documentário afirma que nunca escreveu roteiros para os filmes que dirigiu e que filma como escreve poesia, com liberdade e improviso.
O documentário de Amir Labaki, em cartaz no Festival do Rio e que será exibido na Mostra de SP, perfila Jorgen Leth com depoimentos, poemas e trechos de filmes do cineasta dinamarquês de forma fragmentária, estrutura que homenageia sua visão sobre cinema.
Aos 72, Leth já dirigiu 44 filmes, quase sempre documentários experimentais que incluem diários de viagens, reflexões antropológicas e perfis de esportistas. O mais famoso é "O Ser Humano Perfeito", curta de 1967 que analisa os limites do homem e que motivou Lars von Trier a realizar "As Cinco Obstruções" (2003), em que desafia Leth a refilmá-lo em cinco situações diferentes.
O cineasta já esteve duas vezes no Brasil para participar do É Tudo Verdade, festival dirigido por Labaki. O projeto de "27 Cenas" surgiu em 2008, quando Labaki filmou uma entrevista com o dinamarquês.
Apesar da estrutura não linear, o longa de Labaki está longe de ser um filme cifrado e compõe um resumo claro de quão radical e diversificada é a obra de Leth. As três primeiras passagens são um exemplo.
O filme começa com trecho de "Good and Evil" (1976), ensaio existencialista em preto e branco que dialoga com o cinema de Ingmar Bergman e com Alain Resnais de "O Ano Passado em Marienbad" (1961). Depois, há "Credo", em que Leth diz que um filme não é uma história, mas uma série de imagens juntas em que o fotograma individual importa mais que o conjunto. A terceira cena é "Directing", em que surge entre nativos das ilhas Trobiand, no Pacífico, preparando a filmagem de "Notes on Love" (1989).
Esses primeiros minutos causam um choque positivo, estimulam o espectador a querer saber mais sobre Leth. A hora seguinte corresponde bem a essa expectativa.