São Paulo, quinta-feira, 01 de novembro de 2001

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CRÍTICA

Diretor continua a dar lições morais

TIAGO MATA MACHADO
CRÍTICO DA FOLHA

Meio angelicais, meio bestiais, mas sempre precoces e temperamentais, são essas "crianças impossíveis" e abastardadas que surgem no cinema do pós-guerra.
São os órfãos de guerra do neo-realismo italiano, a juventude transviada do cinema americano dos anos 50, os delinquentes da nouvelle vague francesa, o Ivan de Tarkovsky, a Mouchette de Bresson, a Zazie de Malle. É um "cinema da juventude" que surge da constatação da existência de um hiato entre o mundo dos adultos e o dos jovens.
"Kids" (1995) pertencia a essa tradição na medida em que provava que, aprofundado o hiato, restava aos "órfãos" do lixo cultural do fim de século forjar, só para eles, um mundo ainda mais amoral, hedonista e perigoso do que antes. O alerta vinha do diretor Larry Clark, que partia de roteiro do amigo de seu filho, o skatista Harmony Korinne ("Gummo").
"Kids" era a expressão desse hiato: equilibrava-se entre a visão de Korinne de seu universo e a lição que Clark queria passar à geração de seu filho, entre a amoralidade do primeiro e o moralismo do segundo.
Daí todo aquele drama em torno da Aids, invenção de Clark que feria o roteiro de Korinne. Em "Bully", Clark continua a dar as suas lições de educação moral e sexual, mas já não pode contar com os diálogos e o empirismo de Korinne.
Restam só as lições. E elas partem de um moralista até certo ponto ambíguo, que precisa antes flertar com a juventude, criando personagens que atraiam o público jovem, para depois dar seu devido sermão.
Como diz o subtítulo original do filme, trata-se da história real de uma vingança colegial. Em uma cidade da Flórida, um jovem casal e sua turma decidem dar um jeito em um amigo cuja crueldade já vitimou a todos. Clark sugere que é a "educação de vencedor" que recebeu do pai que faz do tal garoto um babaca, mas, quando este passa de algoz a vítima, o filme não deixa de ratificar os conselhos paternos que advertiam contra o perigo de andar na companhia de "perdedores".


Bully - Juventude Perdida
Bully  
Direção: Larry Clark
Produção: EUA, 2001
Com: Brad Renfro, Rachel Miner
Quando: estava programado para hoje, mas só será exibido na semana de 2 a 8, com horários a definir




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