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CINEMA/ESTRÉIA
"DRAGÃO VERMELHO"
Passatempo aceitável, filme traz novamente Hannibal
Longa é apenas uma sombra de "O Silêncio dos Inocentes"
INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA
Quem é Hannibal Lecter? Um
personagem, uma grife, um
detetive? Em todo caso, ei-lo chegando a seu terceiro filme, que
pretende narrar uma aventura
acontecida antes de seu encontro
com a jovem Clarice Starling (Jodie Foster) em "O Silêncio dos
Inocentes".
Em linhas gerais, Hannibal não
dedica ao policial que o prendeu,
Graham (Edward Norton), o
mesmo calor que dedicará no futuro a Clarice. Ainda assim, vai
ajudá-lo a capturar um outro "serial killer", Francis Dolarhyde
(Ralph Fiennes), o tal Red Dragon
do título.
Dito assim, estamos no domínio da repetição, o que não implica necessariamente desprazer.
Hannibal (Anthony Hopkins) é
um detetive da estirpe do Father
Brown criado por Chesterton, cujo poder de dedução é tão intenso
que o dispensa de acompanhar as
investigações "in loco".
Se existe um problema com essa
nova aventura intelectual de Hannibal é, certamente, a sombra de
"O Silêncio dos Inocentes". Hannibal é antes de mais nada um ser
anti-social. Seu canibalismo é
proporcional ao seu desespero
diante de um mundo tão pouco
apto a absorver intelectos como o
seu. Nessa medida, também, é um
ser monstruoso.
O encanto do "Silêncio" passava
pela ambiguidade de suas relações com Clarice, em quem via
um ser superior (como ele) e a
quem amava (a seu tortuoso modo). Hannibal se afirmou ali como um Dr. Mabuse sem causa,
que em vez de tentar conquistar o
mundo se contenta com desprezá-lo ativamente.
Dado tudo isso, boa parte do esforço de "Dragão Vermelho" consiste em contornar os problemas
colocados pela premissa do filme
original. Como podemos acreditar que Hannibal tenha se ligado,
anteriormente, a outra pessoa
(sobretudo Norton, o insosso?).
O problema é, a rigor, incontornável, restando ao espectador
acreditar no que vê simplesmente
para não sentir, previamente, que
está jogando seu tempo fora.
Aceita então a convenção, "Dragão Vermelho" se mostra aceitável também num aspecto capital,
isto é, na proposição de um bom
enigma.
No entanto, a trama proposta
mostrará sua limitação quando,
prematuramente, coloca o espectador em contato com o vilão. E,
pior, quando desenvolve o personagem a partir de uma psicologia
bem barata (os maus tratos recebidos na infância determinam seu
caráter) e o associa extemporaneamente a William Blake, o místico, poeta e desenhista do século
18 inglês.
Pior ainda, quando recorre a
um clichê surrado e atribui ao policial Graham uma família sob
medida para os padrões predatórios do Dragão Vermelho.
Mesmo uma solução em princípio interessante (o vilão se apaixona por uma garota cega) favorece um desenvolvimento em que
os aspectos afetivos ganham corpo, suplantam claramente as
questões lógicas (isto é, as que justificam a presença de Hannibal na
parada) e determinam um desenlace em que as coisas parecem
ocorrer muito mais em função de
descontroles emocionais do que
do desenvolvimento de um determinado raciocínio.
Ou seja, "Dragão Vermelho" é
um passatempo aceitável, tipo para ver e esquecer, e apenas uma
sombra da obra-prima que é "O
Silêncio dos Inocentes".
Dragão Vermelho
Red Dragon
Direção: Brett Ratner
Produção: EUA/Alemanha, 2002
Com: Anthony Hopkins, Edward Norton,
Ralph Fiennes
Quando: a partir de hoje nos cines
Anália Franco, Butantã, Eldorado,
Gemini, Pátio Higienópolis e circuito
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