|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Autor tem estilo ferino
especial para Folha
Gore Vidal mudou a face do
romance histórico. Livros como "Lincoln", "Império",
"Hollywood" e "Washington,
D.C." ajudaram a dar respeitabilidade ao gênero, que hoje
conta com nomes como Marguerite Yourcenar ("Memórias
de Adriano"), Umberto Eco
("O Nome da Rosa") e Tom
Stoppard ("Arcadia").
Também cristalizaram a imagem dos EUA como nação imperialista. Vidal não mostra
apreço por presidentes como
James Polk, que travou uma
sanguinária guerra contra o
México para abocanhar a Califórnia e a Costa Oeste, e Theodore Roosevelt, que praticou
uma política intervencionista
em Cuba, no Panamá e nas Filipinas.
"Fui criado como todos os
americanos, acreditando que
somos um país amante da paz e
que, por azar, acabamos nos
envolvendo nas guerras das
outras nações", afirma Vidal.
"Revendo "Burr', "Lincoln' e
"1876'", explica, "percebi que
havia algo grande no centro
dessas narrativas, algo que não
conseguia ver em meu próprio
trabalho: que somos impulsionados para a conquista, seja
por amor a Deus, seja por algum código genético peculiar".
Vidal nasceu a 3 de outubro
de 1925, em West Point, e passou a infância e adolescência
em Washington. Escreveu seu
primeiro romance, "Williwaw"
em missão no Pacífico, durante
a Segunda Guerra Mundial.
Já seu segundo livro, "A Cidade e o Pilar" causou escândalo
nos EUA por conta do conteúdo homossexual. O "New York
Times" recusou-se a resenhá-lo, à época.
A política está no sangue da
família. O avô materno, Thomas Gore, foi senador por
Oklahoma. O romancista é irmão por afinidade de Jackie
Kennedy e primo de Al Gore. O
próprio Vidal concorreu à Câmara dos Deputados em 1960 e
em 1972, perdendo nas duas
ocasiões. Talvez por causa disso tenha preferido refugiar-se
na costa da Itália.
Em 1995, lançou "Palimpsesto - Uma Biografia", em que
descreve os primeiros 39 anos
de sua vida. O livro dividiu a
crítica, mas ninguém nega que
é saborosa fonte de fofoca de
alto nível. Entre os retratados,
nem sempre sob luz favorável,
estão Tennessee Williams (admirando o traseiro do então senador John Kennedy), Allen
Ginsberg, Jack Kerouac (com
quem Vidal teve um caso breve) e principalmente Jacqueline Bouvier Kennedy.
O autor revela um talento incomum para reunir personagens reais e fictícios e para manipular os fatos históricos. Em
seus romances, cria-se uma
vasta teia de microconflitos por
meio da qual imaginamos penetrar nos tecidos sociais e nas
relações políticas de toda uma
época.
Em seus momentos mais inspirados ("Burr" e "Lincoln",
por exemplo), o quadro favorece as figuras, e vice-versa; nos
menos (como em "1876"), há
uma tendência para o achatamento dos personagens, que
surgem sem vida ou muito caricatos.
Com estilo elegante e ferino,
que lembra Petrônio, e gosto
para a expansão épica na fecundidade dos incidentes e caracteres, que remete a Balzac,
Vidal passou mais de cinco décadas tecendo a crônica americana. Hoje, é considerado em
seu país um dos maiores escritores do século. Mas o romancista prefere usar a ironia ao falar de si.
Indagado se recebera um
bom conselho quando era mais
jovem, Vidal responde que sim.
"Meu pai me avisou para nunca
namorar uma garota que chamava a mãe de mamãezinha.
Por isso, namorei o irmão dela
e vivi feliz desde então", jura
ele.
(MP)
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
|