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ANÁLISE
Peso do Metallica te deixa leve
PAULO RICARDO
ESPECIAL PARA A FOLHA
O heavy metal (e suas variações, death metal, speed metal
etc.) consolida-se nos anos 80,
mas suas raízes estão nos 70,
quando Led Zeppelin e Black
Sabbath dão ao rock'n'roll uma
nova dimensão, em termos de
peso e profundidade.
O interesse por magia negra
de Jimmy Page e a paranoia do
Sabbath, que Ozzy eternizou,
detonaram no imaginário da
garotada uma série de associações que, por sua vez, dão à loucura dos grandes centros urbanos e sua intrínseca violência
uma espécie de sentido, tradução e exorcismo. É sob esta ótica que se pode compreender
com mais clareza o tipo de ritual que acontece num show do
Metallica.
Pode-se ir mais longe, ao delta do Mississipi, e assimilar a
revolta dos escravos, a dor do
blues e a música como redenção. Transpondo essa revolta
para os dias de hoje, vemos a
evolução desse gênero desdobrar-se em todo tipo de catarse,
seja a do "white trash" americano contra o sistema ou a do garoto rebelde submetido à tirania (ou descaso, como em "Jeremy", do Pearl Jam) de pais e
professores.
Sob o manto de suas camisetas negras, todos comungam
coletivamente, em estádios nas
metrópoles de todo o mundo,
sua ira e inconformismo, cuspindo o lixo de volta, como dizia Renato Russo, em alto (muito alto) e bom som.
"Kill 'Em All" e "Seek & Destroy" são alguns títulos de canções que exemplificam bem o
que estou querendo dizer. A
tradução da violência dos dias
de hoje, a pressão do sucesso, a
opressão dos padrões estéticos
apolíneos, tudo isso é questionado através da observação e
da assimilação da morte, segundo Arthur Schopenhauer,
responsável por toda a filosofia.
Diante da aceitação da finitude
das coisas, adquirimos mais
elementos para enfrentar o peso do dia a dia.
Não por acaso este novo trabalho da banda se chama
"Death Magnetic". Trabalhando com o fogo dos infernos
(inacreditáveis lança-chamas
ao lado das colunas de som, que
pareciam querer incinerar a lua
cheia que iluminava o Morumbi), explosões de fogos de artifício e muita pólvora, o Metallica
oferece como ninguém o maior
espetáculo do metal dos dias de
hoje. Impressionante.
A espinha dorsal (e membro
fundador, junto com o guitarrista e vocalista James Hetfield) é o baterista Lars Ulrich.
Pequeno/grande Napoleão da
bateria, ele estupra nossos ouvidos a cada patada em seu
bumbo. Que, em inglês, se chama "kick" (chute), numa tradução bem mais acurada do que
acontece ali. Posicionado bem
em frente à coluna de som, o
absurdo de volume é uma verdadeira porrada, causando um
perceptível deslocamento de ar
e das entranhas. A banda é de
uma precisão irritante, uma
máquina, um exército de dar
inveja aos 300 de Esparta. Não
é à toa que Tânatos, o deus da
morte, tem o coração de ferro e
as entranhas de metal. Somos
massacrados pelos decibéis,
pelos riffs marciais, e pela performance enérgica do Metallica, sem piedade até o final do
show, com os "pop hits" (ou
quase) "Nothing Else Matters"
e "Enter Sandman".
Por incrível que pareça, saí
de lá mais leve. E convertido.
Kill "Em All!!!
PAULO RICARDO é cantor e compositor
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