São Paulo, sexta-feira, 02 de março de 2001

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CINEMA/ESTRÉIAS

"DUETS - VEM CANTAR COMIGO"

Ataque ao "american way" se dispersa nele mesmo

TIAGO MATA MACHADO
ESPECIAL PARA A FOLHA

A consagração de "Beleza Americana" pelo Oscar serviu como um endosso: a insatisfação com o american way of life, tema até então restrito ao cinema independente, tornou-se um dos motes preferenciais da indústria cinematográfica americana. A prova disso é a sua recorrência em produções medianas como este "Duets - Vem Cantar Comigo".
Há, neste filme amigável e cheio de lições realizado por papai Paltrow com sua filha starlet Gwyneth, um personagem que é variação do protagonista de "Beleza Americana": um executivo que, frustrado com o trabalho e a falta de amor familiar, se diz "cansado do american way of life".
De certa forma, ele radicaliza o discurso de "Beleza Americana", declarando que a vida da classe média de subúrbio é uma prisão mental e que é preciso destruir o imenso shopping center no qual se transformou o país para que os americanos recuperem sua humanidade. Ele torna-se então, a exemplo do personagem de Kevin Spacey, um junkie inconsequente, mas, como os demais fracassados que povoam o filme, reconcilia-se com sua condição ao encontrar certo consolo numa espécie de "filosofia do karaokê".
A moral de "Duets" é a seguinte: já que os americanos precisam mesmo relaxar, o melhor remédio seria extravasar diante de um microfone, realizando, ao menos por três minutos, o velho sonho de fama. Karaokê também é cultura: cada fracassado do filme terá a oportunidade de aprender alguma coisa ao formar o seu dueto para o grande circuito de concursos de karaokês do país.
Trata-se sempre de duetos improváveis em que o convívio forçado obriga cada um a aprender um pouco com o outro: um taxista de coração puro e desprovido de ambição, que busca apenas estabelecer uma relação mais harmoniosa com os seus semelhantes, forma par com uma jovem maníaca pela fama, arrivista, que está sempre se prostituindo.
Um assaltante negro de boa índole e o ex-executivo branco em busca de fortes emoções, um pilantra velho de guerra no circuito e a filha que acabou de conhecer (Gwyneth, perfeitamente à vontade no papel despretensioso de uma corista vulgar e sem jeito).
O filme equaciona todas as diferenças e frustrações dos personagens em torno do grande consolo que é a cultura de karaokê, promovendo uma espécie de catarse controlada dos alijados da "sociedade de espetáculo". É assim que o potencial crítico do filme vai por água abaixo. Afinal, o karaokê não deixa de ser um dos expedientes mais patéticos e desoladores dessa mesma cultura de classe média que o filme denunciara, a princípio, como "prisão mental".



Duets - Vem Cantar Comigo
Duets

  
Direção: Bruce Paltrow
Produção: EUA/Canadá, 2000
Com: Gwyneth Paltrow, Maria Bello, Paul Giamatti, Huey Lewis
Quando: a partir de hoje nos cines Extra Anchieta, Jardim Sul e circuito




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