São Paulo, sábado, 02 de março de 2002

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LITERATURA

MEMÓRIA

Escritor americano ganhador do Nobel tem obra completa reeditada e é alvo de mais de 200 eventos nos EUA

Aos cem anos, Steinbeck ganha reavaliação

SÉRGIO DÁVILA
DE NOVA YORK

No centenário de seu nascimento, comemorado esta semana e pelos próximos 12 meses no mundo todo, o escritor norte-americano John Steinbeck sofre o que pode ser chamado de "paradoxo de Jorge Amado".
Como ocorre com o escritor baiano (1912-2001), os livros deste californiano de Salinas nunca venderam tanto (são 700 mil exemplares por ano, em mais de 30 países), mas o respeito da crítica não acompanha o tilintar das caixas registradoras.
O vento, no entanto, começa a mudar para o autor de "Homens e Ratos" ("Of Mice and Men", 1937), "As Vinhas da Ira" ("Grapes of Wrath", 1939), "A Leste do Éden" ("East of Eden", 1952) e ganhador do Grand Slam do mundo literário, o Prêmio Nobel de literatura e os americanos Booker Prize e Pulitzer.
No bojo das comemorações dos cem anos -mais de 200 eventos espalhados por 38 dos 50 Estados norte-americanos, o principal deles sendo a reedição de sua obra completa pela editora Penguin-, John Steinbeck começa a ter seu legado literário reavaliado pelos estudiosos e acadêmicos.
Pelo menos é o que afirmou à Folha e reforçou em artigos publicados ao longo da semana seu principal biógrafo, o escritor e expert Jay Parini, autor de "John Steinbeck - A Biography" (ed. Henry Holt, 1995) e professor de literatura no Middlebury Colllege.
Steinbeck nasceu em 27 de fevereiro de 1902, filho de uma professora e um tesoureiro. Morreu em 1968, em Nova York, aos 66 anos, desiludido com as críticas que recebeu ao ganhar o Nobel quatro anos antes ("antiquado" era a principal). Críticas que o levaram a abandonar a literatura. Leia a seguir trechos da entrevista.

Folha - Mais de 50 anos após a publicação do principal de sua obra, por que os livros de John Steinbeck continuam sendo subestimados pela intelligentsia americana?
Jay Parini -
Até bem pouco tempo, e principalmente nos meios acadêmicos, John Steinbeck era considerado um autor de livros para estudantes de primeiro e segundo graus, no mau sentido, de falta de profundidade. Isso felizmente começa a mudar. A saga da família Joad no apocalíptico cenário rural de Oklahoma e Califórnia dos anos 30, conforme narrado em "As Vinhas da Ira", seu livro mais famoso, é um retrato fiel e crítico de uma época. É este clássico que vem puxando a mudança de atitude da academia. Estamos falando de um escritor muito importante para ser ignorado.

Folha - O sr. descobriu qual a origem desse preconceito?
Parini -
Talvez a concorrência na época em que viveu e atuou lhe tenha sido desfavorável. Steinbeck é contemporâneo de nomes como Ernest Hemingway ("Adeus às Armas"), Scott Fitzgerald ("O Grande Gatsby") e William Faulkner ("O Som e a Fúria"), todos grandes romancistas, sem dúvida. O trio sempre foi levado mais a sério do que ele. Mas a balança começa a pender para o outro lado agora. O que tinha sido considerado fator negativo em sua avaliação, a simplicidade da prosa de Steinbeck, hoje em dia passa a contar pontos a favor. As pessoas estão descobrindo que simples não quer dizer necessariamente simplista.

Folha - Em sua opinião, qual o principal mérito de sua escrita?
Parini -
São dois. O primeiro é que, assim como os já citados Hemingway e Fitzgerald, quando você lê um livro de Steinbeck, você sabe que está em boas mãos, nas mãos de alguém que sabe como contar uma história. O segundo é que ele deve ser um dos poucos escritores norte-americanos que são realmente lidos pelas pessoas.

Folha - O sr. é partidário de uma curiosa leitura ecológica da obra de Steinbeck, não?
Parini -
Acho que o californiano foi o primeiro escritor norte-americano sério a ter uma preocupação com a ecologia. Seus personagens sempre buscam uma integração equilibrada com a natureza e a defendem a todo custo.



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