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São Paulo, quarta-feira, 02 de abril de 2003

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COMENTÁRIO

Radiohead pega o pop pelas mãos e o guia à sua maneira

LÚCIO RIBEIRO
DA REPORTAGEM LOCAL

O Radiohead é uma banda a um passo à frente de qualquer ouvido. Isso não é novidade para quem acompanha o pop pelo menos desde o início dos 90 e ainda não entendeu direito o que aconteceu com esta mesma música pop quando o esquisito Thom Yorke proclamou o lançamento de "OK Computer" lá em 1997.
A banda começou indie, barulhenta e "guitarreira" ("Pablo Honey"). No segundo CD ("The Bends"), virou o Pixies inglês. No terceiro, o "OK Computer", era porta-voz das desventuras de andróides paranóides. O Radiohead havia se transformado num grupo antipop, cada vez mais longe da orientação roqueira.
A fórmula estranha, o universo nebuloso e as estruturas musicais fragmentadas que faziam da banda um não-rock tinham tudo para levar o quinteto ao underground. Ao contrário, o Radiohead virou supergrupo. E isso quase acabou com Thom Yorke, que não suportava a badalação sobre o grupo.
Quando o choque de Yorke e de quem ouviu o disco estava passando, veio "Kid A" (2000), e aí a coisa complicou. Esperava-se uma volta às guitarras, mas o que apareceu foi mais esquisitices, mais sons etéreos, mais complicação, mais antiqualquer coisa.
No disco seguinte, "Amnesiac" (2001), este sim seria uma volta ao pop, "teria" alguma guitarra e tal. Qual o quê. Lá estava o fenômeno Radiohead sendo analisado pelo crítico de jazz da revista de alta cultura "New Yorker".
Eis que agora chega este "Hail to the Thief". E o pop mostra que não aprende. A gigante expectativa para o disco é a de que ia marcar a volta do grupo ao som "mais palatável", com as indefectíveis guitarras em profusões.
"Hail..." tem lá suas guitarras, enfim. Estão lá, embora elas percam em presença aos pianinhos climáticos, à voz desesperada de Thom Yorke, que parece cantar sentado no alto de uma montanha em Marte. Mas é mais pop que os dois discos anteriores.
Os 15 primeiros segundos que abrem o álbum e pertencem à boa "2 + 2 = 5" é indicativo de como a banda vem "enfrentando" o apelo dos fãs, que a cada disco pedem um Radiohead como "The Bends". E a cada álbum vem algo completamente diferente.
Pois o começo de "2 + 2 = 5" começa com um duelo de uma guitarra contra um ruído de interferência. O ruído vai levando a melhor até a guitarra encontrar seu tom e armar a virada da canção, na segunda parte, para então descambar num rock'n'roll que à muito não se via no Radiohead.
A partir daí o disco leva essa mistura de algo que podemos categorizar de barulhos experimentais e rock até o fim. A complexa "Backdrifts", de pulso robótico e barulho, hã, intergaláctico, já torna o disco obrigatório na quarta faixa. "There There", o primeiro single, é a canção mais simples do Radiohead em anos e a maior aproximação do rock a que se permitiu o grupo. Quando você pensa que já conhece "Hail to the Thief", ele vem diferente e mais completo na audição seguinte.
Dá para dizer que a banda, lá em 1997, não era um grupo diferente dentro da música pop. O Radiohead estava pegando o pop pelas mãos e o guiando à sua maneira. E agora o apresenta como um produto acabado, pronto.
O Radiohead é a grande banda deste que antes era conhecido como rock'n'roll. Ou os outros grupos seguem o caminho de Thom Yorke ou serão apenas bandas que lembram outras bandas.


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