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Filme busca complexidade de Saldanha
Técnico de futebol, comentarista esportivo e militante comunista ganha perfil em documentário do É Tudo Verdade
Diretores divergem sobre a inserção do personagem na política atual: "Estaria de saco cheio", diz um; "Votaria num candidato do PCB", crê o outro
JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA
Sob o singelo título "João", o
documentário dirigido por André Iki Siqueira e Beto Macedo,
que passa hoje no festival É Tudo Verdade, procura desvendar
as múltiplas facetas de um personagem complexo: o técnico
de futebol, comentarista esportivo e militante comunista João
Saldanha (1917-90).
"A trajetória dele conta boa
parte da história do Brasil no
século 20", resume o cineasta e
ex-publicitário Macedo, gaúcho de Porto Alegre radicado
no Rio e profundamente ligado
ao Botafogo -do qual chegou a
ser vice-presidente durante
seis meses, em 2004.
Macedo já sonhava com um
documentário sobre Saldanha
quando, em 2004, foi convidado pelo jornalista carioca (e
vascaíno) André Iki Siqueira,
que planejava fazer uma biografia e um filme em torno do
personagem.
"Eu cuidei da pesquisa, das
pautas e das entrevistas, e o Beto [se encarregou] mais da parte de vídeo", resume Siqueira.
"No livro [publicado no final do
ano passado], você tem o meu
João. No filme, há um pedaço
do meu João; outro do Beto; e
outro ainda do Pedro Bronz, o
editor, que foi fundamental para o documentário."
De acordo com Macedo, "a
pesquisa foi feita em todos os
arquivos conhecidos, no Rio,
São Paulo e Porto Alegre: Cinemateca Brasileira, MAM, TV
Globo, TV Cultura, TVE, RBS,
Museu da Imagem e do Som,
Canal 100, inúmeros jornais,
arquivos particulares, material
da família, arquivos do extinto
Dops..."
O material mais precioso, na
avaliação de Macedo, é o oriundo das mesas-redondas e dos
programas de entrevistas, atrações em que "o Saldanha brilhava intensamente".
"Optamos por deixar ao máximo, dentro do possível, que o
próprio Saldanha contasse sua
história e suas histórias", diz o
cineasta.
Política
Siqueira destaca a colaboração dos parentes do biografado:
"A família nunca me pediu nada, autorizou a minha pesquisa
em todos os documentos dos
arquivos dos órgãos de repressão, me forneceu fotos, passaportes etc. Foram ótimos. Nem
quiseram ver o filme antes da
primeira exibição. Tivemos liberdade total".
Os dois co-diretores só divergem quando se trata de imaginar o que Saldanha faria no
contexto político atual.
"O João estaria de saco cheio.
A esquerda perdida, os paradigmas arruinados, as alianças estranhas. Para convencer o João
de um voto, seria um trabalho
gigantesco", diz Siqueira.
Já para Macedo, "ele votaria
num candidato do PCB [Partido Comunista Brasileiro]. Se
não houvesse, votaria em alguém mais à esquerda. Até no
Lula, creio". E conclui: "Ele, na
verdade, era muito conciliador
dentro do Partidão, era uma
voz sensata sempre contemporizando conflitos. Aquele lado
maluquinho dele jamais aparecia".
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