São Paulo, quarta-feira, 02 de abril de 2008

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Filme busca complexidade de Saldanha

Técnico de futebol, comentarista esportivo e militante comunista ganha perfil em documentário do É Tudo Verdade

Diretores divergem sobre a inserção do personagem na política atual: "Estaria de saco cheio", diz um; "Votaria num candidato do PCB", crê o outro

JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA

Sob o singelo título "João", o documentário dirigido por André Iki Siqueira e Beto Macedo, que passa hoje no festival É Tudo Verdade, procura desvendar as múltiplas facetas de um personagem complexo: o técnico de futebol, comentarista esportivo e militante comunista João Saldanha (1917-90).
"A trajetória dele conta boa parte da história do Brasil no século 20", resume o cineasta e ex-publicitário Macedo, gaúcho de Porto Alegre radicado no Rio e profundamente ligado ao Botafogo -do qual chegou a ser vice-presidente durante seis meses, em 2004.
Macedo já sonhava com um documentário sobre Saldanha quando, em 2004, foi convidado pelo jornalista carioca (e vascaíno) André Iki Siqueira, que planejava fazer uma biografia e um filme em torno do personagem.
"Eu cuidei da pesquisa, das pautas e das entrevistas, e o Beto [se encarregou] mais da parte de vídeo", resume Siqueira. "No livro [publicado no final do ano passado], você tem o meu João. No filme, há um pedaço do meu João; outro do Beto; e outro ainda do Pedro Bronz, o editor, que foi fundamental para o documentário."
De acordo com Macedo, "a pesquisa foi feita em todos os arquivos conhecidos, no Rio, São Paulo e Porto Alegre: Cinemateca Brasileira, MAM, TV Globo, TV Cultura, TVE, RBS, Museu da Imagem e do Som, Canal 100, inúmeros jornais, arquivos particulares, material da família, arquivos do extinto Dops..."
O material mais precioso, na avaliação de Macedo, é o oriundo das mesas-redondas e dos programas de entrevistas, atrações em que "o Saldanha brilhava intensamente".
"Optamos por deixar ao máximo, dentro do possível, que o próprio Saldanha contasse sua história e suas histórias", diz o cineasta.

Política
Siqueira destaca a colaboração dos parentes do biografado: "A família nunca me pediu nada, autorizou a minha pesquisa em todos os documentos dos arquivos dos órgãos de repressão, me forneceu fotos, passaportes etc. Foram ótimos. Nem quiseram ver o filme antes da primeira exibição. Tivemos liberdade total".
Os dois co-diretores só divergem quando se trata de imaginar o que Saldanha faria no contexto político atual.
"O João estaria de saco cheio. A esquerda perdida, os paradigmas arruinados, as alianças estranhas. Para convencer o João de um voto, seria um trabalho gigantesco", diz Siqueira.
Já para Macedo, "ele votaria num candidato do PCB [Partido Comunista Brasileiro]. Se não houvesse, votaria em alguém mais à esquerda. Até no Lula, creio". E conclui: "Ele, na verdade, era muito conciliador dentro do Partidão, era uma voz sensata sempre contemporizando conflitos. Aquele lado maluquinho dele jamais aparecia".


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