|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
"MISTÉRIO EM FLORENÇA"
Primeiro romance de Ostrowski é labirinto de investigação da morte
MARCOS CESANA
especial para a Folha
Logo de saída em
"Mistério em Florença", que está
sendo lançado hoje
às 19h na 16ª Bienal
Internacional do
Livro em São Paulo com a presença da autora, uma nota histórica
nos informa que Francesco de
Medici (1574-1587) e Bianca Capello, grão-duque e grã-duquesa
da Toscana, morreram; e que o
cardeal Ferdinando de Medici
(1587-1609) deve assumir o trono.
Os fatos relatados e as personagens existiram e fazem parte de
um dos mais importantes períodos na história da humanidade,
do pensamento e das artes no
mundo: a Renascença.
Além de Montaigne, Maquiavel
e Santo Agostinho, o livro é repleto de citações de personalidades
contemporâneas do cardeal Ferdinando de Medici, interlocutor
no livro "Mistério em Florença", à
época.
Junto dele, estamos nós todos,
leitores. Ora complacentes, ora
desconfiados com as circunstâncias que motivaram a morte do
grão-duque e da grã-duquesa, e
da participação de Ferdinando
em tudo isso.
A narrativa, por sua vez, aproxima-nos de Ferdinando de Medici
e faz da cumplicidade com o leitor
algo que vai além da morte do
grão-duque e da grã-duquesa, como deciframento da trama.
Ela estabelece uma ponte entre
o leitor e todos os pensamentos
de Ferdinando, os pronunciáveis
e os ocultos.
Assim, o leitor é psicanalista de
Ferdinando e vê nele, tantas vezes, as suas próprias qualidades;
como também, suas imprecisões,
incertezas e medos.
Pensamentos
Ao contrário do que se pressente com o título "Mistério em Florença", o que se vê são os pensamentos em seus labirintos; muito
mais do que as descrições de ambientes e costumes.
Esse livro trabalha com uma
quase não-ação: raramente é descritivo.
Por outro lado, é vertical quando aborda temas como poder e a
diferença entre o bem e o mal, e/
ou a necessidade que os seres humanos têm em tê-los: o bem e o
mal.
Melhor ainda é o rigor estilístico
que a autora Simone Ostrowski,
com muito trabalho provavelmente, conseguiu encontrar.
Algumas passagens servem tanto para explicar determinados
mitos ou pensamentos filosóficos, como para ocupar no romance, com precisão, o que seria a ausência das palavras.
Sobre os outros personagens de
"Mistério em Florença", devo dizer que são de suma importância;
especialmente para entendermos
melhor o próprio Ferdinando, e
quem sabe, para também nos entendermos melhor.
Transformações
Assim, faço de uma passagem
desse livro uma tentativa de entender-me e reservo-me o direito
de transmiti-la para o leitor, para
ele, entendendo-se melhor, sair
transformado e pronto para tantas outras pequenas passagens
transformadoras de "Mistério em
Florença".
Trecho: "Deve pensar que,
diante de Laura, eu me transformava em menino; e que diante de
Guido, eu me tornava um monstro.
Esse monstro, eu o venço a cada
dia; militia est vita hominis super
terram.
Esse menino, de uma inocência
que destoa bastante de mim por
vezes, eu os preservo de todas as
maneiras possíveis. Sou muitos,
mas ninguém é um só.
E as grandes distâncias que separam meus integrantes não
constituem uma contradição peculiar em mim; em qualquer um
vêem as mesmas divergências.
Mas devo esclarecer que os melhores estão em luta, divididos; e
os piores encontram mais coerência na queda".
Avaliação:
Livro: Mistério em Florença
Autora: Simone Ostrowski
Editora: Revan
Quanto: R$ 12 (122 págs.)
Texto Anterior: Biografia tropeça, mas mostra genialidade do excêntrico Glenn Gould Próximo Texto: Bienálicas Índice
|