São Paulo, terça-feira, 02 de maio de 2000


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"MISTÉRIO EM FLORENÇA"
Primeiro romance de Ostrowski é labirinto de investigação da morte

MARCOS CESANA
especial para a Folha


Logo de saída em "Mistério em Florença", que está sendo lançado hoje às 19h na 16ª Bienal Internacional do Livro em São Paulo com a presença da autora, uma nota histórica nos informa que Francesco de Medici (1574-1587) e Bianca Capello, grão-duque e grã-duquesa da Toscana, morreram; e que o cardeal Ferdinando de Medici (1587-1609) deve assumir o trono.
Os fatos relatados e as personagens existiram e fazem parte de um dos mais importantes períodos na história da humanidade, do pensamento e das artes no mundo: a Renascença.
Além de Montaigne, Maquiavel e Santo Agostinho, o livro é repleto de citações de personalidades contemporâneas do cardeal Ferdinando de Medici, interlocutor no livro "Mistério em Florença", à época.
Junto dele, estamos nós todos, leitores. Ora complacentes, ora desconfiados com as circunstâncias que motivaram a morte do grão-duque e da grã-duquesa, e da participação de Ferdinando em tudo isso.
A narrativa, por sua vez, aproxima-nos de Ferdinando de Medici e faz da cumplicidade com o leitor algo que vai além da morte do grão-duque e da grã-duquesa, como deciframento da trama.
Ela estabelece uma ponte entre o leitor e todos os pensamentos de Ferdinando, os pronunciáveis e os ocultos.
Assim, o leitor é psicanalista de Ferdinando e vê nele, tantas vezes, as suas próprias qualidades; como também, suas imprecisões, incertezas e medos.

Pensamentos
Ao contrário do que se pressente com o título "Mistério em Florença", o que se vê são os pensamentos em seus labirintos; muito mais do que as descrições de ambientes e costumes.
Esse livro trabalha com uma quase não-ação: raramente é descritivo.
Por outro lado, é vertical quando aborda temas como poder e a diferença entre o bem e o mal, e/ ou a necessidade que os seres humanos têm em tê-los: o bem e o mal.
Melhor ainda é o rigor estilístico que a autora Simone Ostrowski, com muito trabalho provavelmente, conseguiu encontrar.
Algumas passagens servem tanto para explicar determinados mitos ou pensamentos filosóficos, como para ocupar no romance, com precisão, o que seria a ausência das palavras.
Sobre os outros personagens de "Mistério em Florença", devo dizer que são de suma importância; especialmente para entendermos melhor o próprio Ferdinando, e quem sabe, para também nos entendermos melhor.

Transformações
Assim, faço de uma passagem desse livro uma tentativa de entender-me e reservo-me o direito de transmiti-la para o leitor, para ele, entendendo-se melhor, sair transformado e pronto para tantas outras pequenas passagens transformadoras de "Mistério em Florença".
Trecho: "Deve pensar que, diante de Laura, eu me transformava em menino; e que diante de Guido, eu me tornava um monstro.
Esse monstro, eu o venço a cada dia; militia est vita hominis super terram.
Esse menino, de uma inocência que destoa bastante de mim por vezes, eu os preservo de todas as maneiras possíveis. Sou muitos, mas ninguém é um só.
E as grandes distâncias que separam meus integrantes não constituem uma contradição peculiar em mim; em qualquer um vêem as mesmas divergências. Mas devo esclarecer que os melhores estão em luta, divididos; e os piores encontram mais coerência na queda".


Avaliação:   

Livro: Mistério em Florença Autora: Simone Ostrowski Editora: Revan Quanto: R$ 12 (122 págs.)

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