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TELEVISÃO
Crítica/DVD
Série "Ó Pai, Ó" une diversão e reflexão em doses certeiras
Produção com Lázaro Ramos estabelece olhar sincero sobre a periferia baiana
HUGO POSSOLO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Faço o mea-culpa! Achei
que "Ó Pai, Ó" era cinema axé. Fui preconceituoso. Não danço axé, não ouço
axé, mas transaria com qualquer uma das Sheilas. A Bahia é
muito mais.
Não vi o filme nem a peça.
Muito menos li o livro. Agora o
farei. Isso depois que assisti aos
DVDs de "Ó Pai, Ó", com direção geral de Monique Gardenberg, lançados pela Som Livre.
A série tem roteiro conciso e
preciso, com diálogos inteligentes. Os roteiristas Guel Arraes e Jorge Furtado emprestam conhecimento da linguagem cinematográfica, coisa rara às séries brasileiras, aliando
seus talentos à visão dos diretores de cada episódio, que marcam seus estilos sem ferir o eixo narrativo geral.
Por ter sido criado em teatro
pelo Bando de Teatro Olodum,
adaptado para cinema e, depois, para série, pela mesma
trupe, o projeto ganha em cada
detalhe. Cada personagem está
moldado aos atores. Facilitam a
narrativa e jamais fogem da fábula original.
Periferia
É animador que a maior produtora de ficção do país, a Rede
Globo, abra espaço para séries
como "Antonia", "Cidade dos
Homens" e "Ó Pai, Ó", que estabelecem um olhar sobre a periferia e contam, em diferentes
cores, histórias riquíssimas sobre a vida dos brasileiros reais.
Não importa que seja a favela
carioca, os manos e as minas
paulistanos ou que nos retirem
o olhar turístico sobre o Pelourinho, em Salvador. As séries
nos têm feito encontrar com
uma brasilidade que a televisão
escondeu por anos. Chega da
favela de novela, maquiada para parecer melhor do que é.
Nessas séries, os pobres são o
que são. Desejam uma saída,
mas nem por isso são raivosos e
sem alegria. Vivem seus amores
e humores, são personagens
humanos, nada plastificados,
conquistando o público.
Em "Ó Pai, Ó" cada episódio,
com sua trama bem tecida, despreocupada de quem a protagoniza, revela talentos. Contam-se boas histórias, de maneiras
interessantes, não se restringindo a ser mero entretenimento. Jogam delicadas questões ao espectador, como a do
mendigo Negócio Torto, que,
ao tentar curtir um show junto
a outros um pouco menos pobres que ele, acaba levando
uma surra de um segurança.
Até o excluído dos excluídos
tem uma história a ser contada.
Da aldeia baiana, desfrutamos histórias de como o Brasil
é universal. Vai além da denúncia da violência, triste e necessária, e mostra que os pobres,
cheios de contradições e alegria, têm voz e vez. Não é simples ter essa visibilidade na
Globo. É uma conquista.
E, melhor, é feito com apuro
técnico e visão artística sensível, importantes para nossa
cultura. Diversão que não se
priva de provocar reflexão.
Quando tanto se fala no papel
da televisão pública, a maior
emissora privada do país dá um
excelente exemplo de obras de
ficção que têm qualidade e audiência significativas.
HUGO POSSOLO, 46, é palhaço, dramaturgo e
diretor do grupo Parlapatões e do Circo Roda
Brasil
Ó PAI, Ó
Distribuidora: Som Livre
Quanto: R$ 39,90, em média
Classificação: não indicada a menores
de 14 anos
Avaliação: bom
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