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Roa Bastos e escritores do Brasil, do Uruguai e da Argentina recriam a Guerra do Paraguai
Atrás das trincheiras
DENISE MOTA
EDITORA-ASSISTENTE DA ILUSTRADA
Ninguém com menos de 130
anos pode testificar ao certo de
que forma se abateu a Guerra do
Paraguai sobre essa que foi a primeira república popular da América do Sul, no início do século 19,
e que deu lugar à terra da instabilidade política, da inexpressividade econômica e do contrabando
desenfreado.
Daí que tenha se debruçado sobre o conflito -também conhecido como Guerra Grande, sobretudo no Paraguai- o Prêmio
Cervantes Roa Bastos, escritor
que encabeça "Los Conjurados
del Quilombo del Gran Chaco".
A obra, lançamento da editora
Alfaguara, será publicada no Brasil pela editora Record, como "O
Livro da Guerra Grande".
"Los Conjurados" recria os
acontecimentos que causaram a
morte, segundo dados históricos,
de 75,8% da população total do
Paraguai (e de 96,5% dos homens
do país) nos mais de cinco anos
(1864-1870) em que resistiu, sem
sucesso, à investida da Tríplice
Aliança -formada por Brasil,
Argentina e Uruguai.
Mas não se trata de análise da
guerra: o conflito é narrado a partir de cartas deixadas por um observador britânico, o tradutor e
viajante Francis Richard Burton
-em missão pela América do Sul
por ordem da coroa inglesa-, e
pelo viés da ficção.
Do livro também participam escritores de outras das nações envolvidas à época no conflito, hoje
curiosamente (e pretensamente)
unidas por outra guerra -a comercial- por meio do Mercosul.
Contribuem com as diversas visões da batalha que compõem a
obra o escritor brasileiro Eric Nepomuceno, o uruguaio Omar Prego Gadea e o argentino Alejandro
Maciel.
"O espírito do livro é contra
qualquer guerra", afirma Nepomuceno. "A Guerra do Paraguai
foi abjeta, e todos temos uma culpa enorme nesse cartório."
Esconderijo
O eixo em torno do qual se desenvolve a história é uma menção
que Burton fez, em uma de suas
cartas, a um esconderijo de desertores onde brasileiros e argentinos, uruguaios e paraguaios teriam vivido "juntos, em mútua
amizade ou em inimizade com o
resto do mundo".
É o mote para Bastos olhar o
conflito através da rotina do general argentino Bartolomé Mitre,
que, de sua tenda, assiste ao fuzilamento de oficiais e à destruição
de pelotões enquanto traduz o
"Inferno" da "Divina Comédia",
de Dante. Ao seu lado, um artista,
Cándido López, pinta a guerra
com a única mão que lhe sobrou
após os combates (veja quadro
com alguns dos personagens à página E-2).
O carioca Eric Nepomuceno
transpõe para o presente os resquícios do remoto conflito, ao
narrar a história do resgate de um
título de nobreza por um homem
solitário e preso ao passado, no
Rio de Janeiro.
Na busca pelo direito de ser chamado de barão, ele acaba descobrindo ter entre seus antepassados um certo Florencio Silveira,
ardiloso soldado brasileiro que
participou da Guerra do Paraguai
e que teria tido filhos com mulheres de oficiais dos Exércitos paraguaio e uruguaio.
Alejandro Maciel escolhe tratar
das memórias de um soldado que,
depois de ter escapado de um ataque paraguaio, recebe de um oficial moribundo a missão de compor a participação argentina na
trégua que se articula num território distante dos campos de batalha.
A trajetória de um general, registrada nos diários e cartas que
deixou, conduz a narrativa de
Omar Gadea. O autor se ocupa
em dar voz ao relato do oficial
que, do refúgio dos desertores, é
designado para a tarefa de assassinar Venancio Flores, então líder
do Uruguai, numa tentativa de
impulsionar o fim do conflito.
"É complicado chamar o que se
passou no Paraguai de guerra.
Foi, sim, um genocídio absolutamente covarde", diz Nepomuceno. "Todos somos responsáveis
pelo destino patético desse país."
LOS CONJURADOS DEL QUILOMBO DEL GRAN CHACO. Autores: Roa Bastos,
Eric Nepomuceno, Omar Prego Gadea e
Alejandro Maciel. Editora: Alfaguara (na
internet: www.alfaguara.com.ar;
lançamento no Brasil pela editora
Record, ainda sem data definida).
Quanto: US$ 16 (249 págs.). Onde
encomendar: por R$ 58,90, na livraria
Cultura (www.livcultura.com.br)
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