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Comida
Bauru com DNA
Projeto certifi cará as casas que fazem a receita tradic ional do sandu íche criado no Ponto Chic
JANAINA FIDALGO
DA REPORTAGEM LOCAL
Ao pedir um bauru, nunca se
sabe ao certo qual versão do
sanduíche será servida. Se estiver em uma padaria paulistana,
é provável que o chapeiro lhe
ofereça um pão francês com
presunto, queijo e tomate. Em
cidades do interior, o presunto
pode dar lugar ao churrasco.
Se o garçom, porém, trouxer
um pão francês sem miolo, com
fatias de rosbife, rodelas de tomate e de pepino em conserva e
queijo derretido na água, pode
ser que você esteja em uma casa certificada por fazer o "sanduíche bauru tradicional".
A novidade é uma iniciativa
do Comtur (Conselho Municipal de Turismo) de Bauru, que
criou um programa (www.sanduiche.baurusp.com.br)
para identificar com um selo os
estabelecimentos que fazem o
bauru segundo a receita tradicional, descrita e protegida por
lei municipal. No Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e
Artístico Nacional), está em
andamento um pedido para registrá-lo como bem imaterial.
"Em Bauru, popularizou-se o
sanduíche feito com queijo,
presunto e tomate no pão de
forma", diz Helerson Balderramas, presidente do Comtur.
"Queremos resgatar o bauru
originalmente criado em São
Paulo, no Ponto Chic."
Na última terça, em uma festa ocorrida na cidade do interior de São Paulo, foram certificados os cinco primeiros estabelecimentos: três unidades da
casa paulistana Ponto Chic e os
bauruenses Bar do Aeroporto e
Skinão, lanchonete que desde o
final dos anos 50 foi o principal
divulgador do lanche na cidade.
"Cabe ao restaurante, bar ou
lanchonete solicitar o certificado de que faz o bauru tradicional. Depois, uma comissão técnica analisa a maneira como
ele é produzido e emite um parecer", explica Balderramas.
Uma receita ditada
A origem do bauru remonta à
década de 30, à tradicional lanchonete paulistana e é atribuída a um estudante de direito do
largo São Francisco, o bauruense Casemiro Pinto Neto -daí o
nome do sanduíche.
Habitué do Ponto Chic do
largo do Paissandu, Casemiro
ditou como queria seu lanche:
"Abra um pão francês, tire o
miolo e bote um pouco de queijo derretido. Ponha umas fatias
de rosbife e de tomate".
"A grande sacada dele foi
misturar tudo em um único
sanduíche -e ele se vangloriava muito disto. Naquela época,
sanduíche de queijo era sanduíche de queijo; o de churrasco só
tinha churrasco. Misturar carne, queijo e salada era algo
meio absurdo", diz José Carlos
de Souza, atual proprietário do
Ponto Chic, onde 75 mil baurus
são vendidos por ano.
A receita inventada por
"Bauru" fez tanto sucesso que o
sanduíche se disseminou rapidamente e, ao longo dos anos,
foi sendo modificado. Ganhou
rodelas de pepino em conserva,
e o rosbife deu lugar, principalmente, ao presunto.
"O sanduíche passou por
uma adaptação no Brasil todo.
Por exigir um processo de
elaboração e não ser facilmente
encontrado pronto, o rosbife
acabou sendo substituído por
presunto. Ficou mais fácil de
fazer e se popularizou, mas
perdeu aquela originalidade",
diz Balderramas.
O jeitinho brasileiro alterou
também a técnica original de
derretimento do queijo, em que
fatias de gouda, prato e estepe
(ou suíço) são fundidas na água
quente com manteiga e resultam em uma mistura extremamente cremosa e saborosa que
escorre para fora do pão. Hoje,
a prática mais recorrente consiste em tostar a mussarela na
chapa, o que a torna rija.
Diferencial do Ponto Chic, o
truque do derretimento dos
queijos na água foi herdado do
Carlino, restaurante que pertencia ao pai de Odílio Cecchini, fundador da lanchonete.
"O bauru é um patrimônio
histórico paulista, brasileiro.
Não podemos dizer que é nosso
e que ninguém mais pode prepará-lo. Se não houvesse esta
boa vontade de brigar pelo nome do sanduíche, o bauru poderia cair no esquecimento",
diz o dono do Ponto Chic.
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