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CINEMA - DOCUMENTÁRIOS
Hollywood desperta para a não-ficção
AMIR LABAKI
enviado especial a Los Angeles
O 3º Congresso Internacional de
Documentários (IDC3), encerrado
na madrugada de sábado, provou:
Hollywood desperta para a explosão do cinema não-ficcional. Cerca
de mil profissionais vieram a Los
Angeles, nos Estados Unidos, debater a estética, a história e a economia desse formato na Academia
de Artes e Ciências Cinematográficas.
A convite da Academia e da Associação Internacional do Documentário (IDA, na sigla americana), passaram por aqui cineastas
do mundo inteiro, de Werner Herzog ao veterano D.A. Pennebaker,
de Nick Broomfield ao brasileiro
Ricardo Dias.
A multiplicação dos canais de
TV, com a consequente ampliação
da demanda de produções não-ficcionais, trouxe ao congresso representantes da CBS, CNN, Discovery,
E! Entertainment, HBO, National
Geographic Channel e Sundance
Channel, entre outros.
²
Incentivos
A parceria com a televisão em vários estágios da produção tem procurado compensar no mundo inteiro a inexistência de incentivos
estatais específicos. O risco de certa estandardização dos documentários foi apontado pelo diretor do
Sundance Festival, Geoffrey Gilmore.
"A volta da projeção em sala é
uma das prioridades", defendeu
enfaticamente Ricardo Dias ("No
Rio das Amazonas") no debate sobre a produção latino-americana.
O fortalecimento de distribuidores para esse mercado, como a britânica Jane Balfour e o holandês
Jan Rofekamp, parece promissor.
Dramatização ou espontaneidade foi o dilema estético que dividiu
o IDC3. Werner Herzog, um dos
premiados do ano com "Little Dieter Needs to Fly", liderou a ofensiva em favor da utilização de recursos do cinema de ficção na produção de documentários.
No campo oposto, encontravam-se nada menos que os pais do cinema direto, a grande escola documentarista americana da década
de 60 baseada na renúncia a todo
artifício.
Em seus dois primeiros dias, o
congresso parecia uma ininterrupta homenagem a Albert Maysles,
D.A. Pennebaker, Richard Leacock
e Robert Drew.
Uma raríssima reunião dos quatro líderes do movimento marcou
a abertura do evento, na quarta-feira passada, para a apresentação
de cópias restauradas da trilogia
Kennedy ("Primary"; "Crisis";
"Faces of November").
Inexiste registro comparável da
ascensão e queda de John Fitzgerald Kennedy. O estilo despojado
do cinema direto preserva o frescor da trilogia.
Richard Leacock resumiu em
seis os mandamentos do movimento: "Nada de entrevistas. Nada
de tripés para a câmera. Nada de
luzes artificiais. Nada de repetições. Jamais dirigir o posicionamento de alguém que está sendo
filmado. Jamais intervir no que está acontecendo".
Falando à Folha no dia seguinte,
Leacock defendeu que as regras
continuam atuais. "Mas a nova revolução é a câmera digital", frisou.
Na tarde da quinta passada, numa mesa sobre o futuro do documentário, Herzog pôs fim ao consenso: "É preciso ir muito além da
estupidez do cinema direto, que só
arranhou a superfície da verdade.
É por meio da fabricação que você
pode entrar nas áreas misteriosas".
A seguir, lembrou que várias sequências de "Little Dieter" foram
encenadas.
A cineasta russa radicada nos Estados Unidos Marina Goldovskaya
criticou o radicalismo de Herzog.
"Uso o cinema direto quando preciso. Faço entrevistas se acho necessário."
O veterano Albert Maysles subiu
então ao palco. Sereno, foi sucinto:
"Ser observador e não ter medo de
contar a verdade. Não é tão difícil
assim conseguir captar a verdade
em filme". De pronto Herzog concordou enfaticamente com a cabeça. Uma paz provisória estava selada. Ninguém duvida que o debate
adentre o século que se avizinha.
²
O jornalista
Amir Labaki viajou a Los Angeles a
convite do evento.
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