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DVDs recuperam toda ira de Sergio Bianchi
Caixa reúne quatro curtas e cinco longas-metragens realizados pelo diretor de "Cronicamente Inviável" desde 1972
Cineasta espera que, agora, o público possa criticá-lo com propriedade; "Esses filmes não foram vistos por quase ninguém", diz
ANA PAULA SOUSA
DA REPORTAGEM LOCAL
Mais comentados do que vistos, os filmes de Sergio Bianchi
são, enfim, lançados em DVD. A
caixa reúne cinco discos, com
curtas e longas-metragens, e
antecede a chegada aos cinemas de "Os Inquilinos", seu
mais sereno filme, com estreia
marcada para o próximo dia 26.
"Falam que sou tosco? Agora
poderão ver os meus filmes e
dizer se sou mesmo", afirma,
sem disfarçar o ressentimento
que leva consigo. "Todos foram
muito mal distribuídos. Pode
ser que, assistindo aos filmes,
algumas pessoas revejam a fama desagradável que eu adquiri
e que está me incomodando."
Que fama? "De que sou um troglodita! Tudo bem, tenho rompantes, mas agressão física,
nunca. Bom, só uma vez...", diz,
rindo da contradição.
Bianchi recebeu a Folha em
seu apartamento, no centro de
São Paulo. À entrada, há uma
bicicleta, que, avisa, nunca sai
dali. Acima do sofá, um quadro
de sua lavra. Jogou rasgos de
tinta sobre uma fotografia de
1940 e mudou as feições de seis
mulheres unidas por um traço:
o estrabismo.
Apesar de a família ter sonhado, para ele, um futuro de
engenheiro, logo cedo foi capturado pelas imagens: o avô e o
pai eram fotógrafos. Nos anos
1970, quando batia as primeiras claquetes em sets, trabalhava também com fotografia e design. "Decorei apartamentos,
fiz caixas para famílias ricas.
Era metido a artista." Era? "Virei burocrata. É tanto carimbo
para fazer um filme, tanto documento, que parece que só faço isso. Perdi o frescor."
É, de certo modo, esse frescor -ainda que torneado por
cenas cruas e frases de efeito -
que se encontra em sua estreia,
"Maldita Coincidência", um
apanhado de esquetes que
soam como preâmbulo aos filmes que se seguiriam. Havia
ali, porém, uma ironia e uma
ousadia estética que, com o
passar do tempo, parecem ter
se enrijecido. "Não sei muito
bem o que fiz nesses 40 anos. É
difícil falar dos meus filmes,
são coisas que nunca revi", diz.
"Só sei falar que "Cronicamente Inviável" e [o documentário] "Mato Eles?" me deram
muito prazer. Dos outros, me
lembro de brigas, dificuldades
e dos amigos mortos." Bianchi
cita também alguns momentos
que, tal e qual uma foto, ficaram fixados na sua lembrança.
De "Romance", congelou a
cena de sexo que, pela dificuldade de transportar os equipamentos pelas escadarias do
Masp, foi feita com uma equipe
reduzida. "Criamos um clima
ótimo e a cena funcionou como
poucas." De "Cronicamente
Inviável", guardou a comida
feita por uma mulher num casebre perdido numa estrada
em Roraima. "Ela tinha quatro
pratos. Como éramos uns 20,
fizemos um revezamento."
Dos incômodos, guarda, sobretudo, a eterna cobrança de
um cinema brasileiro que, a seu
ver, é esquizofrênico. "Há um
modelo imaginário de como
deve ser o cinema brasileiro, do
que é popular. Mas o erro de raciocínio começa na distribuição. Não há espaço real para o
cinema nacional. No meio dessa indústria imaginária, tento
entender a realidade. Pode até
ser que eu entenda errado, mas
por que edulcorar?"
FILMES DE SERGIO BIANCHI
Direção: Sergio Bianchi
Distribuidora: Versátil
Preço: R$ 160 a caixa; R$ 44,90 cada
Lançamento: hoje, às 19h, na Livraria
Cultura (Shopping Bourbon, r. Turiassú,
2.100), com debate com o diretor
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