São Paulo, segunda, 3 de fevereiro de 1997.

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Ruy Guerra apresenta musical datado e chatice de 80 minutos

MARILENE FELINTO
da Equipe de Articulistas

Dois filmes do cineasta Ruy Guerra chegam às locadoras: ``A Bela Palomera'' e ``Ópera do Malandro'' (que é na verdade um relançamento). O primeiro é baseado em uma história de Gabriel García Márquez, ``O Amor no Tempo do Cólera''.
Já o musical ``Ópera do Malandro'' (1986) é adaptação da peça de mesmo nome, que Chico Buarque escreveu em 1978 -inspirada na ópera (``dos Três Vinténs'', de Brecht) da ópera (``do Mendigo'', de John Gay, 1728).
Na história de Chico Buarque, o mendigo é um malandro -Max (Edson Celulari)- que vive no Rio, durante a Segunda Guerra.
O anti-herói Max sobrevive de contrabando e da exploração de sua amante Margot (Elba Ramalho), prostituta empregada no cabaré de um cafetão alemão.
Em represália ao papel dos alemães na guerra, Max arma uma briga que acaba por destruir o cabaré. Para se vingar do malandro, o alemão demite Margot. Max, em contrapartida, investe na conquista de Ludmilla (Claudia Ohana), filha do alemão.
Não é de todo estranha a idéia de fazer um musical de cinema com o tema da malandragem brasileira. Afinal, há música na dança desses personagens-tipos sociais, no seu modo de existir e se relacionar com as convenções.
São os vadios, os marginais e suas festas, suas influências, seus compadrios, como diria Antonio Candido sobre a malandragem do Rio já do século passado.
Com um misto de orgulho da própria marginalidade e de perpétua sujeição à necessidade é que se dá a relação entre o malandro e o policial corrupto Tigrão, vivido por Ney Latorraca.
Essa ``dialética da malandragem'' tem no centro um pícaro. O malandro é o pícaro, e o pícaro dança. ``Ao pícaro é dado espiar o avesso das instituições e dos homens: o seu aparente cinismo não é mais que defesa entre vilões encasacados.'' (Bosi)
A linguagem do musical cairia como uma luva. Mas algo saiu errado e tudo soa datado no filme de Ruy Guerra: a Segunda Guerra vista daqui, o malandro dos anos 40 e o próprio tom do musical, inspirado no modelo americano.
Parte do problema está na atuação apática dos atores, que não sustentam os papéis de cantores e dançarinos.
Além da ``Ópera do Malandro'', Guerra e Buarque escreveram juntos o musical ``Calabar'', nos anos 70. Atualmente Guerra filma o romance ``Estorvo'', de Chico.
Parceria estranha é a que Ruy Guerra fez com Gabriel García Márquez para o obscuro ``A Bela Palomera'', filme ralo de conteúdo, sem ritmo e de som ruim.
Trata-se da história da paixão proibida entre um poderoso fabricante de cachaça da cidade de Parati (Ney Latorraca) e uma mulher casada (Claudia Ohana).
O fato ocorre em 1892, no âmbito da novidade da República, leve pano de fundo histórico para o realismo fantástico que dá centro ao resto. Mas o resto não passa das tentativas de comunicação dos amantes proibidos -por intermédio de pombas mensageiras, 80 minutos de pura chatice.

Vídeo: Ópera do Malandro Produção: Bra/Fra, 1986, 103 min. Direção: Ruy Guerra Com: Edson Celulari, Claudia Ohana
Lançamento: Paris (011/872-4404)
Vídeo: A Bela Palomera Produção: Bra/Esp, 1985, 78 min. Direção: Ruy Guerra Com: Ney Latorraca, Claudia Ohana
Lançamento: Paris
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