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David Lynch mostra sua arte em Paris
Com novo filme, diretor de "Veludo Azul" exibe seus desenhos, quadros e fotografias a partir de amanhã, na Fundação Cartier
Obras seguem a obsessão do cineasta pelas metamorfoses e têm conexões com "Twin
Peaks" e "Eraserhead"
ALEXANDRE WERNECK
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DE PARIS
Um homem, na tela, transforma-se em outro. Uma mulher, na tela, se transforma em
outra. Um personagem disforme, em um quadro, feito de tinta, mistura-se com o cenário, a
ponto de quase desaparecer.
Tem sido assim o trabalho do
artista americano David Lynch:
uma explosão de transformações e evaporações de sujeitos.
"Bem... Eu não sei", responde
Lynch, 61, à Folha, sobre o porquê de uma dedicação tão grande à metamorfose em sua carreira artística, marcada por filmes desafiadores, capazes de
dar nós em muitas cabeças, como "A Estrada Perdida" e o novo "Inland Empire".
A resposta veio para o riso e a
perplexidade de um grupo de
jornalistas atentos ao cineasta
logo após um "tour" pela impressionante exposição "The
Air Is on Fire", que a Fundação
Cartier de Arte Contemporânea abre para o público na capital francesa amanhã, com um
inédito retrato do quase desconhecido trabalho de Lynch em
artes plásticas.
Na imponente sede da fundação, um edifício de aço e vidro, estão reunidos, em três
ambientes, mais de 500 desenhos, duas dezenas de quadros,
centenas de fotografias e outras tantas alteradas por ele no
computador.
Lynch tenta fazer consigo o
que faz com seus personagens:
quer desaparecer, confundir-se
com sua obra. O "não sei" se
junta a várias respostas em que
ele recusa uma posição reflexiva. Em seu rosto, expressões de
sofrimento para responder e
uns poucos sorrisos de ironia.
Diante do questionamento sobre o uso do azul nas telas, ele
diz apenas que gosta da cor.
Prefere atribuir sua arte à libertação produzida pela meditação transcendental, que ele
pratica há 33 anos.
"O que digo na pintura que
não posso dizer nos filmes é o
que você vê na pintura. Cada
arte tem seu mundo, e ele é
sempre um mundo sem palavras", diz Lynch.
Referências
Mas ele não consegue evitar.
Há conexões demais. Embora
queira fazer sua direção sempre misturando os sentidos,
Lynch significa. Por exemplo,
Bob, personagem central da série de enormes pinturas que
ocupam a sala principal do primeiro piso. É, segundo ele, "alguém que experimenta as coisas no mundo". Até para responder sobre a conexão entre
este e outro Bob, o da série de
TV "Twin Peaks", ele quer soar
hermético. Diz: "É outro. Existem muitas pessoas no mundo
chamadas Bob". Mas ficam claras as relações com suas obsessões habituais.
O som, por exemplo: ao longo
da mostra, pode-se ouvir uma
mesma e contínua música, "climática", "atmosférica", industrial, que poderia estar na trilha
sonora de "Eraserhead", seu
primeiro longa -assim como
saiu claramente do teatro bizarro do filme o visual do cineminha montado no subsolo para exibir alguns vídeos.
Em alguns pontos da mostra,
o visitante pode apertar um botãozinho e acrescentar à música, aleatoriamente, algum efeito sonoro industrial.
"Amo indústrias, máquinas,
sons de máquinas, eletricidade.
Mas, no cinema, o som e os efeitos sonoros têm que casar com
as cenas. Na exposição de pintura, a idéia é diferente. Quero
criar uma atmosfera, um clima
fluido."
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