São Paulo, quarta-feira, 03 de março de 2010

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"O Profeta" inaugura gênero carcerário francês

Produção de Jacques Audiard foi vista por 1,2 milhão de espectadores em seu país e bateu Michael Haneke no Bafta

Filme mostra a "educação criminal" de um imigrante e revela que, também na França, atividades ilegais são comandadas da cadeia


DA REPORTAGEM LOCAL

Ao atender, por telefone, a reportagem da Folha, o diretor francês Jacques Audiard, de 58 anos, foi menos formal do que costumam ser seus conterrâneos. Não conteve a curiosidade. "Queria muito saber como vocês, brasileiros, receberão o filme. É um tema que vocês conhecem muito bem. A minha cadeia te convenceu?"
Audiard, que ficou conhecido no circuito de arte brasileiro pelo thriller "De Tanto Bater Meu Coração Parou" (2005), admite que, de alguma maneira, "Carandiru" e "Pixote - a Lei do Mais Fraco", de Hector Babenco, serviram de inspiração à sua história carcerária.
"O Profeta", que estreia no Brasil em 30 de abril, pode ser definido como um filme sobre a "educação criminal" de um jovem. Pela primeira vez, somos levados para dentro de uma cadeia francesa. Lá, como aqui, é detrás das grades que alguns homens comandam as atividades criminosas. Lá, diferentemente daqui, as cadeias não parecem masmorras. Mas não deixam de ser "escolas" para o aprendizado da violência e do exercício de poder.
Vencedor do Grande Prêmio no Festival de Cannes, em 2009, o filme conquistou, no último sábado, nove troféus no César, o mais importante prêmio do cinema francês, e vendeu mais de 1,2 milhão de ingressos no país. No próximo domingo, disputará o Oscar de melhor filme estrangeiro. Nessa mesma categoria, Audiard bateu, há duas semanas, "A Fita Branca", de Michael Haneke, no Bafta, o Oscar inglês.
"Isso tudo nos mostra que o filme tem alguma força", diz o cineasta. "O cinema francês não faz filmes de prisão. Não conhecemos esse gênero e tampouco conhecemos nosso sistema carcerário, salvo por alguns documentários. O imaginário carcerário de um francês é, sobretudo, o imaginário construído pelo cinema norte-americano."
Além da narrativa complexa, que vai do drama social ao suspense, "O Profeta" chama a atenção pelo elenco composto, sobretudo, por rostos desconhecidos. "Estava decidido a trabalhar com caras novas. Se reconhecessem o ator logo que o filme começasse, os espectadores já não se sentiriam tão dentro da cadeia." Ele misturou então não atores e atores de teatro a uma figuração composta por ex-presidiários.
O protagonista, Malik El Djebena, é um jovem de 19 anos que ascende "socialmente" naquele sistema. "Não sabemos o que teria acontecido a ele caso não tivesse ido parar na prisão. Será que teria descoberto sua inteligência da mesma maneira?", pergunta.
Pouco sabemos da história de Djebena antes de sua chegada, com ar tímido, à cadeia de leis incógnitas. É por meio dele que esse mundo se revela ao espectador. "Ele deve tudo o que tem à prisão."
Audiard diz que, apesar de ter causado certo espanto no país, o filme foi bem recebido nas cadeias. "Os diretores das prisões, por exemplo, ficam felizes pelo fato de terem sido representados, dessa história ter vindo a público. É como se eles tivessem passado a existir." (ANA PAULA SOUSA)

Acompanhe a cobertura completa Oscar

http://www.folha.com.br/1003213


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